DF: Polícia Militar invade terreiro em Planaltina e chama espaço de ‘inferno’

Brasil de Fato

A Casa Ilê Asé Omin Yeminjá Ogunté, localizada em Planaltina, teve o espaço invadido na noite desta terça-feira (23) por agentes da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF). Na ocasião, a polícia estava em busca de um homem que, supostamente, realizava tráfico de drogas em via pública. 

De acordo com vídeos divulgados e relatos, o homem, já algemado, entrou no terreiro perseguido pelos policiais. Nas imagens, é possível ver quando um agente da Polícia segura o homem, que estava com ferimentos na cabeça. Em outro momento, outros policiais pulam o muro do terreiro em busca do suposto traficante.

Já em outra filmagem, agentes da PMDF começam a proferir palavrões contra as pessoas que estavam no local. Em um dos vídeos, é possível ouvir o policial falando “macumbão” para os membros do terreiro. “Sem nenhuma preparação, arrombaram o portão, invadiram o terreiro, que estava em função, adentraram os quartos de santo e chamaram o nosso espaço sagrado de inferno”, mostra uma das publicações feita pela Casa nas redes sociais.

Ao Brasil de Fato DF, o Pai Uanderson, líder religioso da Casa Ilê Asé conta que, quando a abordagem começou, ele estava no pátio do local fazendo uma limpeza espiritual. “Por volta das 18h30, estava abrindo meus trabalhos espirituais, quando de repente, meu irmão invade minha casa algemado com a polícia segurado nele”, conta.

“O policial o jogou [o homem] no chão. Ele jorrava sangue pela boca, nariz, ouvidos, um corte imenso na cabeça. Ele caiu algemado de barriga para cima e o policial subiu em cima dele. Pedi para o policial parar com isso, porque iam matar ele. De tanto eu pedir e implorar, o policial o soltou e saiu. Depois, invadiram minha casa, pularam os muros, profanaram minha casa, invadiram meu templo e corpo espiritual”, disse Uanderson.


Em uma das imagens, policial segura homem algemado no chão / Foto: Reprodução

Uanderson também explica que o foragido é irmão biológico dele, mas que não faz parte da religião. “O detido é meu irmão, mas nem mora aqui. Não sou a favor disso. Se errou, tem que pagar. Não apoiamos isso. Mas, agora, é diferente bater e espancar uma pessoa que já estava no chão. Foram mais de 15 policiais invadindo e profanando minha fé”, relata também em um vídeo publicado nas redes sociais.

Além das investidas contra o foragido, Uanderson também contou que a polícia agrediu o filho dele. “Algemaram, deram empurrões e jogaram ele no chão. Eles nos trataram como bandidos da pior espécie, sendo que nós não temos nenhuma ligação com esse tipo de situação que estava acontecendo lá fora”, explica.

Na ocasião, também foi dada ordem de prisão ao líder religioso e ao seu filho. Na delegacia, Uanderson conta que os policiais acusaram os membros da Casa de agressão.

Procurada pelo Brasil de Fato DF, a Polícia Militar do DF informou que, através do Grupo Tático Motociclístico (GTM-34), foi feita a prisão de um homem que realizava tráfico de drogas em via pública. Segundo a nota, durante a ação, moradores locais, aproximadamente 20 pessoas, tentaram intervir, buscando resgatar o suspeito da guarnição.

“A ação foi rapidamente controlada com a chegada de apoio policial, garantindo a segurança dos agentes e a continuidade do procedimento. O irmão do homem preso tentou obstruir a detenção, mas também foi contido pelos policiais. Outro homem foi preso por favorecimento pessoal e resistência. O detido foi conduzido à 16ª delegacia para os procedimentos legais”, diz a polícia.

Segundo Márcia Regina Medrado, também da Casa Ilê Asé, a pessoa já estava algemada e imobilizada e, mesmo assim, houve agressões e abusos de autoridade por parte da PMDF.

“Nós mesmos buscamos chamar a polícia quando o primeiro policial, que já estava com o homem imobilizado, começou a sufocar ele com o joelho sobre o pescoço e peito do homem. Ele estava acorrentado e, mesmo assim, o policial relutava e não queria soltá-lo. Fomos acusados de estar acobertando, dando abrigo a marginais e jamais faríamos isso. Respeitamos a lei e, assim, gostaríamos de ser respeitados também”, explica Márcia.

Intolerância religiosa

Em novembro de 2022, a Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras apresentou um mapeamento do racismo religioso no Brasil, no qual representantes de 255 terreiros de todo o país foram ouvidos. Quase a metade registrou até cinco ataques nos dois anos anteriores ao estudo.

“Eu queria saber se, caso fôssemos uma igreja católica ou evangélica, eles realmente teriam essa conduta. Se eles teriam esse ato de intolerância religiosa, de racismo. Queria saber se eles agiriam dessa forma”, destaca Uanderson.

Para Aurélio de Odé, autoridade tradicional do Ilê Odé axé Opô Inlé, a atitude da PMDF coloca uma fragilidade e vulnerabilidade do racismo religioso, que é enrustido nas pessoas durante todos. “Não saiu ainda, está entranhado no dia a dia das pessoas”.

“Os órgãos de segurança têm que passar por um processo de reestruturação e de informação para que eles possam aprender a tratar todos os segmentos religiosos de forma laica e respeitosa”, destaca. “Uma abordagem como essa desperta várias questões, como o respeito aos direitos humanos, a liberdade religiosa, um tratamento adequado nas abordagens em locais sagrados”.

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Da Redação