China define mais de 300 metas para modernização socialista até 2029
Brasil de Fato
Aprofundar reformas na educação, estrutura fiscal, nas áreas científicas, tecnológicas e militar, entre várias outras, foram alguns dos objetivos estipulados pelo 20° Comitê Central do Partido Comunista da China (PCCh), em sua terceira sessão plenária, visando a modernização socialista no país até 2029.
A resolução final da plenária contém 60 artigos que respondem a sete objetivos gerais, que vão desde a construção de uma economia de mercado socialista de alto nível até o avanço em iniciativas como a China Pacífica, passando pela melhora da “capacidade de liderança e governança no longo prazo do Partido”.
Os objetivos não são novos, eles já haviam sido estipulados no 14º Plano Quinquenal (2021-2025). A novidade desta terceira plenária são as mais de 300 medidas e a especificação de que elas devem ser cumpridas até 2029, quando a República Popular da China completará 80 anos. Embora algumas das medidas estejam descritas de forma genérica, a resolução dá uma ideia das prioridades para o país nos próximos anos.
Como toda a estrutura do governo e do Partido, o Comitê Central tem um mandato de cinco anos, e nesse período são realizadas 7 plenárias. As terceiras plenárias em geral marcaram grandes mudanças no país. Foi assim em 2013, na terceira plenária do 18° Comitê Central. O encontro definiu como prazo limite para obter resultados decisivos o ano de 2020, o que foi cumprido, por exemplo, no caso da erradicação da extrema pobreza, tirando quase 99 milhões de pessoas dessa condição nesse período.
Outro exemplo foi o do processo de reforma e abertura, sob o líder Deng Xiaoping, como conta o analista geopolítico Victor Gao, que trabalhou como tradutor de Deng na década de 80. “Em 1978, foi realizada a terceira plenária do 11º Comitê Central do Partido, ali a China decidiu adotar a reforma e a abertura ao mundo exterior, o que significou um ponto de virada no desenvolvimento moderno chinês”.
Novas forças produtivas
O desenvolvimento das novas forças produtivas de qualidade na China tornou-se uma prioridade.
A nova resolução do Comitê Central determina que serão estabelecidos mecanismos para “garantir aumentos de financiamento para indústrias do futuro”, além de melhorar a governança no país “para promover o desenvolvimento de indústrias como tecnologia da informação de última geração, inteligência artificial, aviação e aeroespacial, novas energias, novos materiais, equipamentos de ponta, biomedicina e tecnologia quântica”.
O documento afirma que também haverá modificações no sistema financeiro para fomentar a inovação científica e tecnológica para fornecer maior suporte aos principais programas nacionais e Pequenas e Médias Empresas de ciência e tecnologia.
Um dos desafios para a nova etapa é a formação de trabalhadores e trabalhadoras altamente qualificadas. Não só para a China. No ano passado, países como Canadá, Alemanha ou Reino Unido aprovaram ou atualizaram leis para fomentar a imigração de trabalhadores altamente qualificados.
Na China, a taxa de matrícula no ensino superior vem crescendo constantemente, chegando a superar 60% em 2023, há mais de 200 milhões de trabalhadores qualificados, dos quais 60 milhões são altamente qualificados. Porém há uma escassez de talentos altamente qualificados nas áreas de tecnologia e inovação. A nova resolução do comitê central também afirma que serão explorados caminhos “para estabelecer um sistema de imigração para pessoal altamente qualificado”.
Além disso, estabelece que será concedida “mais voz aos empregadores” visando melhorar os “mecanismos de incentivos para talentos”, e que serão abertos canais que permitam fluxos de pessoal entre universidades e institutos de pesquisa, por um lado, e empresas, por outro.
“A China realmente quer apostar muito na ciência e tecnologia para garantir que os avanços científicos e a criatividade de todos os tipos sejam o principal motor do nosso crescimento econômico”, diz Victor Gao, também professor titular da Universidade de Soochow.
Uma orientação na resolução dessa plenária é a de passar de “investir em capital físico” para “investir em pessoas e capital físico de forma igual”, segundo o diretor do Instituto de Economia Quantitativa e Tecnológica da Academia Chinesa de Ciências Sociais (ACCS), Li Xuesong, durante uma coletiva organizada pela entidade.
Ele explicou que o investimento nas áreas de educação e saúde fortalecem a seguridade social, e promovem o aumento da renda dos moradores urbanos e rurais e o crescimento do grupo de renda média. Isso, segundo o economista, vai promover o ciclo virtuoso de produção, distribuição, circulação e consumo.
“Os investimentos nessas áreas não são apenas sobre educação, mas também envolvem assistência médica, saúde e cuidados com idosos”, diz Xuesong.
Ele explica que atualmente há muitas incompatibilidades e escassez nessas áreas. “Por exemplo, há uma alta demanda por assistência médica e educação de alta qualidade entre o público, mas a oferta é insuficiente”.
Há lacunas também, segundo o especialista nos cuidados de idosos: “nossas instalações são inadequadas”. “Portanto, há uma lacuna significativa no investimento em capital humano em diferentes estágios do ciclo de vida humano, incluindo educação, saúde, assistência médica e cuidados com idosos na China”, conclui.
As duas metas centenárias
A China se encontra na primeira fase da meta do Segundo Centenário. Em 1997, o relatório do 15º Congresso Nacional do Partido Comunista da China (com Jiang Zemin como secretário-geral), mencionou, pela primeira vez, dois objetivos ou metas centenárias: a primeira foi a de construir uma sociedade moderadamente próspera em todos os aspectos até 2021, quando o PCCh completou um século. A segunda é para 2049, quando será a vez da República Popular da China completar 100 anos. Até lá foi estipulado que a China terá se tornado um “país socialista moderno próspero, forte, democrático, culturalmente avançado e harmonioso”. A resolução adotada na reunião representa mais um passo na realização da chamada segunda meta centenária.
Duas metas centenárias da China / Mauro Ramos
O mercado imobiliário
A resolução também afirma que será promovido um novo modelo de desenvolvimento para o setor imobiliário. A ideia é que o sistema habitacional ofereça apoio tanto para aluguéis quanto para compra de moradias.
O setor imobiliário cumpriu um papel importante na economia chinesa nas últimas décadas, chegando a responder por 25% a 30% do PIB do país. Mas o setor também acumulou endividamento. Recentemente o governo central chinês fez uma série de ajustes no setor, no bojo das medidas para conter a chamada “expansão desordenada de capital”.
“Nós enfatizamos a construção do novo antes de descartar o antigo”, diz Yang Zhiyong, diretor do Centro de Pesquisa em Finanças Públicas e Tributação da ACCS.
“Como indústria, o setor imobiliário continua sendo uma parte indispensável da economia nacional e tem um futuro promissor. No entanto, ele não se desenvolverá da maneira extensiva como antes”, explica.
Ele afirma que as novas forças produtivas devem ser utilizadas para transformar as indústrias tradicionais. Assim, o setor imobiliário, como uma indústria tradicional, está passando por um processo de inovação, juntamente com outros setores, diz o economista Yang Zhiyong.
Após a plenária, o presidente chinês, Xi Jinping, já teve reuniões com autoridades do Partido e militares, nas quais pediu que sejam estudados e implementados os princípios da resolução do Comitê Central.
Mudanças na arrecadação nos níveis locais
Com a mudança no papel do mercado imobiliário haverá uma mudança nas fontes de receita dos governos locais. Nos últimos anos, o orçamento dos governos locais, os que ficam abaixo do nível provincial, dependeu muito das receitas de vendas de terras. As políticas de ajuste do setor imobiliário, que frearam a expansão do setor, geraram uma queda nas receitas dos governos locais.
Assim, a resolução do Comitê Central afirma que serão aumentadas as fontes de receita tributária no nível local e que será concedida “maior autoridade para gestão tributária aos governos locais” e será otimizada a “proporção de impostos compartilhados entre os governos central e local”.
Ainda nesse sentido, a resolução anuncia que serão tomadas medidas para que a coleta de impostos de consumo seja feita “mais para baixo na cadeia de produção para consumo, com o poder de coleta sendo passado constantemente para os governos locais”.
Após a plenária, o presidente chinês, Xi Jinping, já teve reuniões com autoridades do Partido e militares, nas quais pediu que sejam estudados e implementados os princípios da resolução do Comitê Central.