‘É preciso respeitar a cultura como um tesouro que temos’, defende Margareth Menezes em abertura de evento sobre culturas e periferias
Brasil de Fato
Ao som dos tambores, jongueiros realizaram uma grande roda repleta das tradições culturais do povo preto que marcou a abertura do Encontro Nacional de Culturas e Periferias na tarde desta sexta-feira (9), na Sala Nelson Pereira dos Santos, em Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro.
O primeiro dia de evento reuniu autoridades do governo federal e municipal, parlamentares e integrantes da sociedade civil com objetivo de aprofundar o debate da 4° Conferência Nacional de Cultura, ocorrida em março, sobre as políticas públicas para o setor.
A ministra da Cultura, Margareth Menezes, ressaltou a importância das políticas de Estado e não de governo para desenvolver o país e a necessidade de valorização da cultura, como uma área estratégica também para a economia brasileira.
“Ficou um buraco na descontinuidade das políticas do setor cultural brasileiro e isso custou atrasos. Quando você destrói as políticas para implementar e fortalecer a cultura, você está destruindo as possibilidades do povo. É preciso respeitar a cultura brasileira como um ativo, um tesouro que nós temos”, disse a ministra.
Já o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), lembrou da retomada dos marcos institucionais da Cultura no atual governo e apontou a necessidade de o encontro debater sobre o marco regulatório do fomento à cultura. A nova lei, sancionada em junho pelo presidente Lula, prevê regras e instrumentos mais eficientes para os gestores públicos, além de democratizar o acesso às políticas culturais.
“[O marco regulatório do fomento à cultura] é tão importante e decisivo para a cultura periférica. Não possível que os produtores culturais, ativistas culturais, pontos de cultura, as mais variadas organizações sobretudo da periferia tem muita dificuldade de executar os recursos que vem do poder público porque não tem regras adaptadas à produção cultura e execução da cultura e essa verdadeira revolução com o novo marco regulatório de fomento à cultura certamente será um debate nestes dias”, afirmou.
O marco regulatório para o setor cultural também é visto como promissor pelo reitor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), José da Costa. A instituição é uma das organizadoras do Encontro Nacional de Culturas e Periferias.
“Durante anos tínhamos apenas as leis de incentivo federal, estadual e municipal para a cultura, depois, com as leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo, pudemos ter uma política nacional de cultura por editais, de cotas para a participação de diferentes setores da sociedade e esta é a importância do marco regulatório, não se tratará mais de uma cultura livre e sem critério, mas sim de construir uma política organizada”, explica.
Investimentos em Niterói
O evento também marcou novos investimentos no município de Niterói. O prefeito Axel Grael (PDT) e Alexandre Padilha assinaram o termo de homologação da reforma do Cinema Icaraí, da criação do VLT no município que ligará a zona norte da cidade ao centro e a renovação da frota com a aquisição de ônibus elétricos.
“O que transforma as cidades é a produção de cultura e o povo ter acesso às cidades e não é possível ter acesso à cultura sem direito à cidade. Precisamos de transporte coletivo de qualidade e sustentável”, enfatizou Padilha.
Ao todo, o investimento via Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para a nova frota e o VLT no município será de cerca de R$ 500 milhões.
Memória e patrimônio
O primeiro dia do encontro terminou com a mesa sobre periferias, memória, patrimônio e o direito à cultura. O debate contou com a participação de Rafa Rafuagi, do Museu do Hip-Hop (RS); do professor e coordenador do Centro de Estudos Periféricos Tiaraju Pablo D’Andrea (SP); da pesquisadora Anna Luísa, que integra o Galpão Bela Maré; do professor e escritor Jaílson Souza e Silva e Mirela Leite, museóloga e coordenadora dos Comitês de Cultura do governo federal.
Tiaraju Pablo D’Andrea lembrou que as periferias e favelas são espaços de encontros de pessoas que são oriundas de outros territórios. O pesquisador ressaltou que o nordeste tem papel fundamental na construção de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro.
“Quando pensamos periferia urbana, temos que pensar a dimensão cultural, mas também a dimensão econômica e de formação das nossas cidades. As cidades brasileiras são altamente segregadas, foram planejadas para apartar os bairros de riqueza e os bairros de pobreza porque a cidade é uma expressão da sociedade e a sociedade brasileira é extremamente desigual”, afirmou Tiaraju destacando o caráter de mobilização social dos territórios a partir da precariedade.
Já a pesquisadora Anna Luísa ressaltou os desafios para salvaguardar as memórias e as identidades dos povos tradicionais, grupos periféricos e favelados. Anna destacou o caráter de acolhimento dos territórios favelados e o impacto da oralidade.
“As pessoas [de favelas e periferias] se entendem pelas suas tecnologias, principalmente a da oralidade, à medida que trocamos informações sobre nossas memória e histórias vamos criando uma teia de salvaguarda dessas memórias e dessas identidades”, salientou.
O evento segue até sábado (10), quando terá mesas para debater sobre “Territorialidades e Expressões Culturais das Periferias do Brasil”, “Economia Criativa, Solidária e Fomentos para as Artes” e “Culturas nas Periferias Diálogos Abertos: debatendo as propostas sobre a Cultura e Periferia na 4ª CNC”.
O evento é uma realização da Promacom – Projeto Mais Comunidade em parceria com a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), a Secretaria de Relações Institucionais, a Secretaria Nacional de Juventude da Secretaria-Geral da Presidência da República, a Fundação de Arte de Niterói (FAN) e com o apoio do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável.
Confira a programação:
10 de agosto (sábado)
10h – Mesa de Debate: Territorialidades e Expressões Culturais das Periferias do Brasil
Convidados: Jeft Dias – Festival Psica (PA) / José Carbonel (Artista visual – PE) / Fred Maciel – Negro F (BH) / Isabela Sousa (Observatório de Favelas) / Eleilson Leite (Comitê de Cultura de São Paulo)
14h – Mesa de Debate: Economia Criativa, Solidária e Fomentos para as Artes e Culturas nas Periferias
Convidados: Fernando Ferrari de Souza (SP) / Cristina Assunção (Conselho de Desenvolvimento Econômico Social e Sustentável) / Elton Teixeira (Secretário de Assistência Social e Economia Solidária de Niterói/RJ)
16h – Mesa de Debate: Diálogos Abertos: debatendo as propostas sobre a Cultura e Periferia na 4ª CNC
Convidados: Secretário-executivo do Ministério da Cultura, Márcio Tavares / Micaela da Costa (Fundação de Arte de Niterói) / Representante do Comitê de Cultura do Rio de Janeiro/ Caroline Neves (Ministério da Cultura) / Luci Souza (Ministério da Cultura)
18h: Show de Awrê
20h: Show de Negra Li + Black Rio
Serviço
Encontro Nacional de Culturas e Periferias
Data: 9 e 10 de agosto (sexta-feira e sábado)
Local: Sala Nelson Pereira dos Santos – Avenida Visconde do Rio Branco, 880, São Domingos, Niterói/RJ