‘Populismo penal’: especialista critica decisão do STF sobre condenações pelo Tribunal do Júri
Brasil de Fato
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta quinta-feira (12), para autorizar a execução imediata da pena produto de condenações pelo Tribunal do Júri. A decisão reascende o debate sobre a prisão após o trânsito em julgado. Em 2019, a Corte firmou o entendimento de condicionar o cumprimento da pena ao esgotamento das possibilidades de recursos.
Para o advogado criminalista e professor de Direito Criminal, André Lozano, trata-se de um “populismo penal”, já que a medida tem apoio de boa parte da sociedade que é favorável a medidas de caráter punitivista, mas que contraria o próprio entendimento do Supremo.
“Mesmo que a pessoa seja condenada no Tribunal do Júri, ainda há possibilidade de recurso, seja para anular o júri, no caso de ter havido alguma irregularidade durante o julgamento, seja porque a decisão dos jurados foi contrária às provas dos autos. Então, de fato, ela [a atual decisão] é absolutamente contrária àquela decisão de 2019”, avalia o professor.
O Tribunal do Júri está previsto no artigo 5º da Constituição Federal, que trata dos direitos e garantias individuais dos cidadãos perante a lei. Nele, são reconhecidos os princípios da “plenitude da defesa, o sigilo das votações, a soberania dos vereditos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida”.
Lozano explica que, embora as decisões do Tribunal do Júri não possam ser modificadas por nenhum outro tribunal, obedecendo ao princípio da soberania dessa instância, irregularidades processuais ou comprometimento de provas podem levar à anulação da sentença. Portanto, segundo o especialista, há que se garantir a presunção da inocência até não haver mais recursos cabíveis.
“Quando você fala que é um direito do cidadão, é uma garantia do cidadão, essa garantia tem que ser interpretada sempre em prol do cidadão, nunca contra ele. Nesse caso, eles estão interpretando essa garantia contra o cidadão. Inclusive contrapondo a outra garantia, prevista também no artigo 5º da Constituição Federal, em outro inciso, que é a presunção da inocência, em que a pessoa só pode cumprir pena, só pode ser presa depois do trânsito em julgado”, afirma.
Na prática, avalia Lozano, a prisão de pessoas que aguardam decisões sobre recursos em liberdade vai depender da avaliação de cada juiz. No entanto, o novo entendimento pode levar à limitação do exercício do direito de defesa dos acusados, por medo de serem presos antes de terem a possibilidade de recorrer.
“Haverá, de fato, uma tendência às pessoas, ao réu, de não comparecer ao Tribunal do Júri, por medo de ser preso. Ou seja, vai fazer com que o réu deixe de exercer o seu direito à defesa com medo de uma prisão que ele entende ser injusta”, critica o professor.
Como votaram os ministros
O relator, ministro Luís Roberto Barroso, votou a favor da prisão imediata, sendo acompanhado por Nunes Marques, André Mendonça, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Carmen Lúcia. “A soberania dos vereditos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução da condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada”, disse Barroso em seu voto.
O ministro Gilmar Mendes inaugurou a divergência, posicionando-se contra a execução imediata da pena. A posição do ministro foi acompanhada no plenário virtual pelos então ministros Rosa Weber e Ricardo Lewandowski, ambos atualmente aposentados. “Não se pode admitir que a execução da condenação proferida em primeiro grau, ainda que por Tribunal do Júri, se inicie sem que haja possibilidade de revisão por tribunal”, declarou o ministro em seu voto.
Uma terceira posição foi apresentada pelo ministro Edson Fachin, que sugeriu a execução imediata da pena apenas em casos de condenações superiores a 15 anos de reclusão ou em situações de feminicídio. O entendimento foi acompanhado pelo ministro Luiz Fux.