Incêndio proposital atinge assentamento do MST no Vale do Paraíba; famílias iniciam reconstrução
Brasil de Fato
“A gente está se reconstruindo mesmo. E contando com alguns apoios, fazendo contato com pessoas da cidade”, conta o agricultor Arlindo Silva* que viu, na última quarta-feira (2), 128 hectares do Assentamento Egídio Brunetto, onde vive, pegar fogo.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) denuncia que o incêndio na comunidade, localizada na cidade de Lagoinha (SP), no Vale do Paraíba, foi proposital. “Criminoso: teve sinal de fogo dos dois lados da rua. As pessoas viram uma moto do lado dos focos, mas não deu para ver o rosto da pessoa”, afirma Silva.
Recentemente, houve outra tentativa de incêndio no assentamento, que não foi bem-sucedida. Arlindo viu de sua casa. “Escutamos um barulho de moto chegando, acendeu e começou o fogo logo depois. Já estava escuro, então foi fácil de ver. Mas pegou em uma área que não teve risco”, relata.
O fogo
Eram 11h da última quarta-feira (2) quando as famílias perceberam o foco de incêndio na beira da estrada. Com a seca e o vento, não demorou para que a chama alcançasse três metros de altura e se alastrasse até o meio da noite.
Oito lotes foram inteiramente destruídos, incluindo duas casas com todos os objetos pessoais, plantações, caixas de abelha, caixa d’água, mangueiras e placa solar. O fogo atingiu, ainda, porções de Área de Proteção Ambiental (APP) e de reflorestamento, desenvolvido há anos pelas cerca de 55 famílias que ali vivem.
“Os prejuízos só não foram maiores devido à rápida ação dos companheiros do território” e à “imediata resposta da Defesa Civil da cidade de Lagoinha, com bombas d’água”, informa o MST em nota. Os bombeiros, que ficam a cerca de 60 km de distância, nas cidades de Guaratinguetá (SP) e Taubaté (SP), não chegaram.
O Brasil de Fato questionou a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo se há investigação sobre o episódio, mas não teve resposta até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto.
“Já sofremos incêndios criminosos várias vezes, por isso temos uma brigada dentro do assentamento. Eu mesma, em anos anteriores, já vi gente descendo de caminhonete para atear fogo. Mas nunca é feito nenhum tipo de investigação”, critica a assentada Rafaela Souza*.
As disputas pela terra
Foi em 17 de abril de 2018, quando o movimento fazia sua jornada de lutas em memória ao Massacre de Eldorado do Carajás (que naquele momento completava 22 anos), que veio a conquista da terra onde hoje está o Assentamento Egídio Brunetto.
A posse dos 1.650 hectares do que antes era a Fazenda Bela Vista, de Egerio Paulo Diniz, veio depois de oito anos de ocupação. Em 2012, a área foi decretada para fins de reforma agrária pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e, em 2014, foi arrecadada.
No mesmo ano, no entanto, por conta de uma vitória judicial do antigo proprietário da fazenda, sob o argumento de que o Incra não tinha a licença emitida pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), as famílias foram expulsas do terreno.
Em novembro de 2015, resistindo à decisão que protegia um latifúndio que, segundo o MST, não cumpria sua função social, as famílias montaram um acampamento na estrada, em frente à área. Assim permaneceram por dois anos, até que, em 2017, ocuparam de novo a fazenda e deram início à produção agroecológica de alimentos.
No ano seguinte, a área foi desapropriada pelo Incra. Atualmente, a regularização da comunidade como assentamento de reforma agrária está na etapa do edital de seleção das famílias.
*Nomes alterados para preservação das fontes.