Lei da igualdade salarial entre mulheres e homens ainda não é devidamente seguida no Brasil, aponta Dieese
Brasil de Fato
A lei que promove a igualdade salarial entre mulheres e homens ainda não funciona como deveria no Brasil. Completando em novembro um ano desde que entrou em vigor, ela é tratada timidamente em negociações trabalhistas entre sindicatos e patrões. É o que aponta análise do Dieese a qual o Brasil de Fato Paraná teve acesso. E a promoção da legislação é urgente. As mulheres ganham menos no mercado de trabalho em todos os níveis de formação. Em cargos de direção, por exemplo, a diferença é de 27%.
Levantamento do Dieese mostra que no primeiro semestre deste ano foram encontradas apenas 63 cláusulas que citam a Lei 14.611/2023. Ela entrou em vigor em 3 de julho de 2023, mas o Decreto que a regulamentou foi promulgado somente em 23 de novembro de 2023. Já o primeiro Relatório de Transparência Salarial, exigência da nova Lei, foi divulgado em 25 de março deste ano. “Desse modo, o primeiro semestre de 2024 é de fato quando os principais dispositivos previstos na Lei de Igualdade Salarial têm início”, avalia a nota técnica.
Segundo o Dieese, nas cláusulas analisadas encontram-se acordos firmados para a promoção de iniciativas de inclusão e capacitação, especialmente para mulheres, visando à sua entrada, permanência e ascensão no mercado de trabalho em igualdade com os homens.
A lei afirma que a igualdade salarial deve ser garantida sem discriminação por sexo, raça, idade e nacionalidade. As empresas devem evitar qualquer discriminação em termos de acesso ao trabalho, alinhado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS 5).
Para especialistas, a atuação das entidades sindicais no campo da negociação coletiva de trabalho é fundamental para reforçar ou ampliar os dispositivos previstos em Lei e promover efetivamente a igualdade salarial entre homens e mulheres.
“É importante salientar também que além das cláusulas que expressam diretamente a Lei da igualdade salarial, há diversas outras a partir de negociações de entidades sindicais para eliminar as desigualdades entre homens e mulheres no local de trabalho”, diz o estudo.
Eunice Miyamoto, Secretária da Mulher Trabalhadora CUT Paraná, diz que a Central trabalha no tema por meio da divulgação de relatórios, registro de denúncias, formação e organização das Mulheres Trabalhadoras em relação ao assunto. Para ela, é necessário que se exija maior participação de mulheres no comando de negociação de acordos coletivos e convenções; criação de mais vagas exclusivas para mulheres, com a descentralização para além de cargos tradicionalmente femininos e especialmente para os cargos de liderança.
“É preciso que haja uma sensibilização das equipes de Recursos Humanos, com critérios claros e transparentes para a divulgação e oferta dessas vagas, incluindo informações sobre salário e regime de contratação”, incentiva Eunice Miyamoto.
O Boletim “Mulheres e Inserção no mercado de trabalho” revela que no ano passado, o Brasil contava com 90,6 milhões de mulheres com 14 anos ou mais, das quais 47,8 milhões faziam parte da força de trabalho. Na média, o rendimento das empregadas sempre era menor do que o dos empregados. A diferença é ainda maior se a mulher for negra. Enquanto um homem branco recebe em média R$ 4,2 mil, uma trabalhadora negra tem vencimentos médios de R$ 1,9 mil. Em cargos de gerência, por exemplo, um homem recebe R$ 9,1 mil. Já a mulher exercendo a mesma função tem remuneração média de R$ 6,6 mil.
É essa discrepância que a Lei da Igualdade Salarial visa combater: “os relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios conterão dados anonimizados e informações que permitam a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos de direção, gerência e chefia preenchidos por mulheres e homens, acompanhados de informações que possam fornecer dados estatísticos sobre outras possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade, observada a legislação de proteção de dados pessoais e regulamento específico”, aponta a lei.
Mulheres paranaenses ganham menos no Sul
No Paraná, neste ano, apenas 13 acordos coletivos citam a lei da igualdade salarial, sendo que as trabalhadoras paranaenses são as que têm o menor salário na região sul e a maior diferença entre homens e mulheres. Enquanto o trabalhador teve renda média de R$ 3550 em 2023, a trabalhadora teve renda de R$ 2654. Diferença de 25%.
Em resposta, a Secretaria da Mulher, Igualdade Racial e Pessoa Idosa (Semipi) diz ter desenvolvido estudos sobre iniciativas que promovam a redução da desigualdade salarial entre homens e mulheres no Estado do Paraná. Dentro da sua alçada, a Lei de Igualdade Salarial entre Homens e Mulheres (Lei nº 14.611/2023) também tem sido observada nas contratações de serviços continuados de terceiros pelo Estado do Paraná que, ainda, tem cumprido a Nova Lei de Licitações.
Além disso, “o Governo do Estado criou um painel de monitoramento, em parceria com o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes), no qual é possível acompanhar os dados, por município, tanto do mercado de trabalho para mulheres quanto às informações a respeito de desigualdade salarial. A partir desses dados, a Semipi tem desenvolvido trabalhos de conscientização nas empresas, em ações conjuntas com a Secretaria de Estado da Indústria, Comércio e Serviços (Seic) e a Secretaria de Estado do Trabalho, Qualificação e Renda (SETR)”.
A diferença de rendimento entre homens e mulheres é sistêmica e leva em consideração diversos fatores. Desde os cargos majoritariamente masculinos versus ocupações predominantes femininas, passando pela discriminação de gênero no processo de recrutamento e seleção para os postos de trabalho, discriminação e obstáculos à progressão da carreira profissional das mulheres e intermitência no mercado de trabalho, particularmente ligada à maternidade e às atividades de cuidados.
Por outro lado, o Dieese reforça a necessidade de sindicatos, patrões e sociedade se empenharem por igualdade. “A negociação coletiva é instrumento que colabora de modo relevante para que a Lei tenha maior alcance e velocidade na superação das desigualdades, ao envolver as representações sindicais na elaboração de propostas que caminham para a igualdade de condições de trabalho entre homens e mulheres”, sugere.