Talíria Petrone é a congressista mais ameaçada nos últimos seis anos, mostra estudo
Brasil de Fato
Alvo de novos ataques e ameaças nas últimas semanas, a deputada Talíria Petrone (Psol-RJ) é apontada em levantamento de pesquisadores da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) como a parlamentar mais atingida pela violência política entre 2018 e 2 de agosto de 2024, considerando os 594 membros do Congresso Nacional. A pesquisa, desenvolvida pelo Observatório da Violência Política e Eleitoral (OVPE), vinculado ao Grupo de Investigação Eleitoral (Giel) da universidade, computa um total de sete ocorrências envolvendo a psolista como vítima.
Na última semana, a deputada chegou a registrar Boletim de Ocorrência (B.O.) e acionar autoridades das Polícias Federal e Civil e do Ministério Público Federal (MPF) após ter sido seguidamente ameaçada de morte via e-mail. Ela também foi alvo de novos ataques racistas e misóginos nos mesmos e-mails. Segundo o mandato de Talíria, a parlamentar é destino constante de ameaças do tipo via redes sociais ou por outros meios eletrônicos. Alguns dos casos já estão em investigação por meio de inquéritos que apuram ameaças vindas de milicianos cariocas.
No registro de casos nacionais de violência política, ou seja, de ocorrências que envolvem também atores de fora do Legislativo federal, Talíria Petrone divide o sexto lugar com o deputado estadual do Paraná Renato Freitas (PT) e a deputada federal Duda Salabert (PDT-MG), que só ingressou no Congresso Nacional em 2023, motivo pelo qual não divide a dianteira do ranking do Legislativo com a psolista. Entre o ano de 2021 e janeiro de 2023, a pedetista atuou como vereadora de Belo Horizonte (MG).
Acima dos três no ranking nacional estão, em primeiro lugar, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 26 ocorrências; na sequência, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), com 17; a vereadora de Niterói Benny Briolly (Psol), com 15; o ex-governador de São Paulo João Doria (sem partido), com 10; e, na quinta posição, a deputada federal Erika Hilton (Psol-SP), que iniciou o mandato no Congresso em 2023, com oito casos. O pesquisador Miguel Carnevale, do OVPE, destaca que o ranking documentado pelo observatório é subnotificado.
“A gente sabe que tem muito mais [casos]. A gente sabe que, até chegar o relato [público] do que vem sendo experienciado [por uma liderança], ocorreram geralmente diversos casos de violência que escapam do nosso monitoramento. Mas, focando apenas nesses que estão registrados, é interessante observar que tem uma concentração de vítimas em partidos envolvidos no cenário recente de polarização brasileira.”
“E a questão da Talíria, da Briolly, da Duda e de outras vítimas registradas é que elas estão tanto envolvidas nesse cenário da disputa ideológica como também fazem parte de grupos politicamente minorizados – mulheres negras, mulheres trans, etc. São grupos que lidam com outras variedades de violência, então, você soma esse cenário já potencialmente violento por conta dos debates ideológicos a todas essas predisposições que se tem de perseguir as vítimas desses grupos minorizados”, emenda o pesquisador.
O levantamento do OVPE usa como metodologia de coleta o monitoramento de mídias digitais, utilizando palavras-chave que detectam casos do tipo e que depois passam por um processo de filtragem feito pelos pesquisadores. A equipe computa ocorrências de violência política que envolvem agressões físicas, psicológicas, violência econômica, sexual, entre outras.
O pesquisador explica que há casos que não integram o acervo do levantamento por questões de ordem variada, como situações que causam constrangimento, casos que são levados diretamente à Justiça, e não a público, entre outras motivações.
Apesar de os ataques relacionados a questões mais ideológicas não serem os de maior número, esse tipo de ocorrência chama a atenção porque, dentre outras coisas, também ajuda a movimentar as redes sociais e mobilizar a tropa de seguidores dos envolvidos.
Segundo Miguel Carnevale, os casos que compõem a maioria das ocorrências são aqueles que envolvem disputas econômicas e de poder em diferentes localidades, como confrontos por cargos, domínio de zonas eleitorais e outras disputas de influência. “Ainda assim, é um alerta você ter uma mulher negra como a vítima de violência mais frequente na Câmara dos Deputados. E o resto do ranking ilustra bem o cenário que se tem atualmente”, comenta.
“Democracia torta”
Procurada pela reportagem para comentar o assunto, a deputada Talíria Petrone disse que as estatísticas mostram uma democracia ainda desfalcada. “O fato de eu ter sido a mais ameaçada nos últimos anos revela o quanto mulheres, mulheres negras, ainda não cabem na política brasileira. Isso deixa a democracia torta porque, se nós não estamos plenamente no espaço político, pautas como creche integral, soberania alimentar, enfrentamento à violência contra a mulher, ficam secundarizadas”, cita.
A parlamentar disse que convive com a violência política desde quando ingressou na vida pública. “São sete inquéritos abertos na PF, dois inquéritos em andamento na Polícia Civil e várias outras ocorrências que sequer foram possíveis de serem registradas, como casos envolvendo grupos de ódio, milícias etc. Há subnotificação porque também há fragilidade dos mecanismos do Estado brasileiro para estabelecer um fluxo para denúncias e também de acompanhamento dos casos e responsabilização dos agressores, mas tenho certeza de que a gente está caminhando para mudar esse quadro.”