Greve nas federais: carta ao presidente Lula e ao ministro Camilo Santana

Brasil de Fato

Permita-nos, presidente Lula e ministro Camilo, seguirmos a ordem das falas na reunião com dirigentes das Instituições Federais de Ensino.

Não foi negociação, ministro Camilo.

O que vivenciamos foi um processo moroso, com poucos avanços, seguido de intransigência, indiferença e desrespeito por parte do governo.

Protocolamos nossa pauta de reivindicações em 11 de julho de 2023, estruturada nos seguintes eixos: recomposição salarial e orçamentária, reestruturação da carreira e revogação de medidas prejudiciais aos trabalhadores do serviço público, editadas nos governos Temer e Bolsonaro; na mesa, o índice de 39,2% de perdas, de julho de 2010 a junho de 2023, já descontados os 9% de reajuste emergencial, dado pelo atual governo no ano passado.

Foram realizadas quatro reuniões de negociação, ao longo do 2º semestre de 2023. Houve alguns pequenos avanços na pauta de revogação de medidas, com o aumento dos valores de alguns auxílios, ainda muito distantes da equiparação reivindicada com o Legislativo e o Judiciário. Reajustes que não configuram reajuste salarial e não alcançam aposentados e pensionistas. Quanto aos demais eixos da pauta, não houve nenhum posicionamento do governo.

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Somente em 18 de dezembro, o governo fez a proposta de ‘recomposição’: nenhum reajuste em 2024; 4,5% em 2025; 4,5% em 2026, além do aumento anunciado dos auxílios creche, saúde e alimentação.

Diante de proposta tão distante da reivindicação, e referenciados nas Assembleias Gerais das Seções Sindicais, em busca de negociação, adiamos a recuperação integral das perdas históricas e rebaixamos o índice de recomposição para 22,71%, dividido em três parcelas de 7,06%, respectivamente, em 2024, 2025 e 2026.

O governo não arredou pé e manteve, intransigentemente, a proposta de 18 de dezembro, empurrando-nos para a greve deflagrada em 15 de abril deste ano. Com a greve se fortalecendo a cada dia, em 19 de abril, o governo alterou um pouco a sua proposta: nenhum reajuste em 2024, 9% em janeiro de 2025 e 3,5% em maio de 2026, configurando no total um índice de 12,8%. Sem reajuste em 2024 e com um índice ainda muito distante dos 22,71% reivindicados, a proposta não foi aceita, com a consequente continuidade da greve, que se ampliava a cada semana.

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Completados 30 dias do movimento paredista, o governo fez nova proposta, complementando aquela apresentada em 19 de abril, com alterações diferenciadas nos steps, que são acréscimos no vencimento básico quando se progride de nível na carreira. O reajuste desigual dos steps aprofunda as distorções da carreira e a desestrutura ainda mais, especialmente quando agrupa os quatro primeiros níveis, conferindo a eles o salário do quarto nível, que ficará com o reajuste de 12,8%, apenas.

Com essa proposta do governo, o salário inicial da carreira teria um reajuste de 31,2%, que beneficiaria menos de 10% da categoria, enquanto que 80%, mesmo com a mudança nos steps, acumularia perdas, em 2026, de -8,61% a -13,41%, se considerarmos a inflação e as recomposições feitas a partir de setembro de 2016. Se tomarmos o período a partir de julho de 2010, as perdas são ainda maiores.

Essa proposta foi acompanhada de um ultimato do encerramento das negociações com 60 universidades, institutos federais e CEFETs paralisados. Não assinamos o acordo, continuamos a greve e, desde então, temos sido tratados ora com descaso e desrespeito, ora com indiferença. Insistimos no processo de negociação.

Fizemos nova contraproposta, rebaixando mais uma vez o índice total de recomposição, agora em 18,85%: 3,69% (IPCA) em 2024, 9% em 2025 e 5,16% em 2026. Na expectativa de negociar efetivamente com o governo, aguardamos a reunião do próximo 14 de junho.

Não se trata de tudo ou nada, ministro Camilo, como disse o presidente Lula, ao fazer uma crítica injustificada à nossa postura no processo de negociação. O histórico apresentado mostra onde se encontra a intransigência.

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Ministro Camilo, o que são R$ 20 bilhões se comparados a R$ 5,5 trilhões?

Na reunião com dirigentes das Instituições Federais de Ensino (IFEs), o ministro afirmou que o aumento com as despesas de pessoal da educação com o conjunto das propostas feitas aos trabalhadores da educação pública federal, abarcando os quatro anos do mandato, é da ordem de R$ 20 bilhões.

Em contrapartida, R$ 5,5 trilhões é o que está previsto para ser entregue a banqueiros e rentistas, apenas em 2024.

O aumento de despesas com pessoal ao longo de todo esse governo, ministro, corresponde a 0,4% dos recursos públicos que aumentarão as fortunas de banqueiros e rentistas, em apenas um ano.

Para trabalhar somente na casa dos bilhões, podemos tomar como referência o aumento da arrecadação no primeiro quadrimestre de 2024. Ela superou em R$ 68,6 bilhões a arrecadação do mesmo período em 2023. O que se arrecadou a mais neste quadrimestre é superior ao triplo do que o governo Lula aportará em aumento de gasto com pessoal, na educação, nos quatro anos de mandato.

Se a educação é prioridade, e não se trata apenas de uma estratégia retórica deste governo, a ela deve ser destinado muito mais investimentos, assim como aos trabalhadores da educação pública federal deve ser assegurada uma remuneração digna. Esses mesmos trabalhadores aplaudidos a seu pedido na reunião, ministro, mas cujas reivindicações orçamentárias e salariais o senhor tem ignorado ao longo desse processo.

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Não é uma greve de dirigentes, presidente Lula!

As várias seções sindicais do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), do qual o SindCefet-MG faz parte, realizaram várias assembleias durante essa campanha salarial, que se iniciou em julho de 2023. De assembleia em assembleia, fomos acompanhando um processo de negociação sem resultados efetivos.

O encerramento desse movimento paredista não será decidido pelos comandos locais de greve, nem pelo comando nacional. Será uma decisão das assembleias gerais de todas as seções sindicais do Andes, nosso sindicato nacional.

Lamentamos profundamente a forma pela qual o presidente Lula desqualificou uma greve forte, que hoje conta com 64 instituições paralisadas e que somente se alonga porque temos sido tratados com intransigência e desrespeito no processo de negociação. O ministro Camilo Santana fala em diálogo, mas nem sequer recebeu uma única vez os representantes da categoria em greve.

Continuamos insistindo no processo de negociação, conscientes da justeza da luta para que o fundo público seja utilizado para promover o bem estar de toda a população, por meio de políticas públicas devidamente financiadas pelos recursos públicos, entre elas a educação pública federal, patrimônio da classe trabalhadora. O que reivindicamos é muito menos que os trilhões entregues no orçamento de 2024 a rentistas e banqueiros.

A luta continua!

*Adelson Fernandes Moreira integra o Comando Local de Greve da Categoria Docente do CEFET-MG.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Da Redação