Em Brasília, o repórter James Kleinfeld apresenta filme que denuncia manipulação política de Israel

Brasil de Fato

O jornalista James Anthony Kleinfeld esteve no Instituto de Ciências Sociais da  Universidade de Brasília (UnB) e no Armazém do Campo para debater os fatos políticos e geopolíticos revelados na sua reportagem The Lobby – USA.

Judeu nascido na Inglaterra, ele se infiltrou em grupos da direita sionista para investigar ações e métodos de pressão do estado de Israel na opinião pública dos Estado Unidos. “Eu fiz esse trabalho há oito anos, em 2016. Eu passei cinco meses em Washington fazendo me passar por sionista. Eu pude gravar secretamente todas as minhas reuniões com os representantes do lobby de Israel em Washington”, explica.

O conteúdo revelado em sua videorreportagem expõe uma estratégia de militância política intransigente do estado de Israel fundamentado na prática genocida do povo palestino.

Gravado na maior parte em perspectiva de primeira pessoa, o documentário registra conversas com profissionais de governos e setores privados que articulam aberta e francamente sobre suas intenções de manipulação da opinião pública, fabricação de escândalos de antisemitismo, protestos falsos e financiados, sondagem de informações e dados de cidadãos críticos ao massacre em Gaza e criação de contas e portais de difamação com divulgação massiva de fake news contra palestinos.

De acordo com o jornalista, um dos objetivos do lobby sionista é desestabilizar o movimento BDS – Boicote, Desinvestimento e Sanções contra os produtos e a economia de Israel , sobretudo nos ciclos de informações de jovens e universitários estadunidenses. O movimento é uma iniciativa pacifista criada em 2005 com inspiração na luta de ativistas contra o apartheid da África do Sul (1948 – 1994).

No documentário fica evidente que o governo de Israel, com o objetivo de combater o movimento BDS, recorre à espionagem de cidadãos norte-americanos. Apesar dessas práticas, os Estados Unidos continuam a dar um apoio incondicional a Israel, sem demonstrar preocupação com as denúncias.

Em uma das cenas do filme, Julia Reifkind, diretora de assuntos comunitários da embaixada de Israel em Washington, em conversa com Kleinfeld, reafirma o trabalho de influência da diplomacia israelense sobre o corpo docente da Universidade da Califórnia. “Estamos trabalhando com vários grupos de ativismo que treinam o corpo docente, por isso estamos ajudando-os com financiamento e fazendo conexões com diplomatas”. Ela acrescenta que “ninguém sabe realmente o que estamos fazendo. Mas tem sido principalmente pesquisas, monitorar o BDS e relatar tudo ao Ministério das Relações Exteriores”.

Após a exibição do filme na UnB, Kleinfeld foi questionado sobre como manteve sua postura diante de lógica argumentativa e imposição política que claramente discorda. “É necessário fazer um ‘poker face’, não rir na hora para rir mais depois. É claro que não concordo, mas não iria dizer isso na cara deles pois meu trabalho era coletar informação de interesse público. eu me preparei e estudei durante quatro meses antes e quando comecei já estava com a mentalidade preparada para fazer a imersão naquele espaço”, explica.

O que mudou desde então?

Com o aumento dos ataques de assassinato em massa e punição coletiva dirigidas pelo primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, contra a população de Gaza desde outubro do ano passado o cenário do público alvo de campanhas desse foi alterado em alguns pontos.

O aumento recente na repressão contra estudantes pró-Palestina em universidades dos Estados Unidos tem suscitado sérias preocupações sobre a aderência aos princípios de liberdade de expressão e protesto.

As manifestações estudantis têm se intensificado, desencadeando uma série de protestos em campi universitários de costa a costa. Desde Los Angeles até Nova York, estudantes têm se mobilizado para mostrar solidariedade ao povo palestino e exigir que suas instituições tomem ações concretas.

O estopim foi uma ação repressiva da Universidade de Columbia, que, em 18 de abril, tomou medidas contra manifestantes pró-Palestina que ocupavam um gramado no campus. A ocupação foi uma resposta à guerra em Gaza e ao apoio das universidades aos interesses de Israel. Desde então, diversos protestos e acampamentos surgiram em faculdades e universidades por todo o país, com as intervenções policiais resultando em mais de 400 prisões até o mês de maio.

Entretanto, Kleinfeld considera que esses fatos evidenciam muito mais sintomas de falência das estruturas de democracia no ocidente do que um avanço real no jogo político.

“A luta dos estudantes inspira e é algo muito bom de ser visto, mas infelizmente o poder do lobby sempre está por cima. Acho que faz parte dos sinais do crescente déficit democrático que estamos vivendo. Cada vez mais estamos vendo governos que assistem a população se manifestando pela interrupção do genocídio, mas não atendem ao chamado com medidas de política efetiva. Exemplo disso, é o Lula que apresenta um discurso, mas que tem pouco efeito na prática”, ressalta.

Censura pós-documentário

A produção do documentário e financiamento do trabalho de investigação operado por James Kleinfeld foi financiada pela Al Jazeera, rede televisa sediada no Catar.

Após a produção da reportagem e antes que fosse lançado publicamente, os grupos de lobby descobriram a identidade e trabalho de James Kleinfeld e reagiram com um grande alvoroço interno.

Líderes proeminentes das comunidades pró-Israel dos Estados Unidos viajaram a Doha, capital do Catar, para se encontrar com autoridades do país. O objetivo das reuniões foi discutir a censura de uma série de documentários. Entre os emissários estava Alan Dershowitz (advogado pessoal de Donald Trump) e Jeffrey Epstein (criminoso sexual e magnata financista americano morto em 2019).

Além disso, há alegações de que lobistas pró-Israel ameaçaram a segurança nacional do Catar, sugerindo que as forças militares dos EUA deixariam sua base no país – financiador da Al Jazeera – caso o documentário fosse ao ar. O governo do Catar, no entanto, negou exercer qualquer influência sobre a rede, que afirma ter independência editorial.

O documentário, intitulado “The Lobby – USA”, acabou não sendo transmitido pela Al Jazeera. Internamente, questões de “segurança nacional” foram apresentadas como justificativa para a decisão. No entanto, o filme foi rapidamente vazado para a Electronic Intifada, um portal digital pró-Palestina, que o publicou no YouTube em 2018.

James Kleinfeld e a equipe de investigação da Al Jazeera foram amplamente aclamados pelo seu trabalho e muitos acreditam que deveriam ter recebido o prêmio Pulitzer por “The Lobby – USA”. Em vez disso, o documentário foi censurado, resultando em um incidente diplomático internacional. Os jornalistas envolvidos foram alvos de intimidação e difamação.

Esse episódio ilustra o poder do lobby pró-Israel, que Kleinfeld e sua equipe buscaram expor, sem imaginar que se tornariam vítimas de sua vasta máquina de influência.

“Os cabeças do lobby trabalharam muito para tentar matar essa história. O documentário acabou não saindo pela Al Jazeera, mas foi vazado em diversas línguas através de portais diferentes. Apesar dessa história louca, isso nunca foi comentado na grande mídia dos Estado Unidos. Teve espaço apenas em alguns meios alternativos. Tenho informação que dois jornalistas já tentaram publicar a história no New York Times, mas não foram autorizados”, explica o jornalista.

Ele concluiu sua participação destacando que dessa forma, “a conquista da censura pelo lobby só reforça poder de manipulação e concentração de informações do estado de Israel”.

Por medida de segurança, o jornalista James Kleinfeld não permite o registro fotográfico das atividades que envolvem a sua participação.

O documentário está disponível no youtube.

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Da Redação