Especialistas comentam queda da popularidade de Romeu Zema em Belo Horizonte

Brasil de Fato

Especialistas atribuem a queda da popularidade de Romeu Zema (Novo) na capital mineira à relação com equívocos na política econômica, à subserviência do governo às mineradoras e à desvalorização dos servidores públicos. Um levantamento do Datatempo indicou que, entre abril e junho, a aprovação do governador caiu 6 pontos percentuais em Belo Horizonte. 

Outra pesquisa, do Datafolha, divulgada no início de julho, indicou que, em comparação com junho de 2022, a rejeição ao chefe do executivo de Minas Gerais aumentou de 21% para 30%. Um novo estudo divulgado pelo mesmo instituto no dia 23 de agosto demonstrou que 50% dos eleitores da capital não votariam de jeito nenhum em um candidato apoiado por Zema. 

Desvalorização dos servidores

Para a economista e especialista em gestão pública e direito tributário Eulália Alvarenga, um dos fatores que têm contribuído para a queda da popularidade do governador são os impasses enfrentados por ele com o funcionalismo público.  

Os trabalhadores reclamam da falta de recomposição salarial, denunciam o desmonte das empresas públicas e o avanço da iniciativa privada e são críticos à insistência da gestão em aprovar a adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). Em contraponto, Romeu Zema concedeu aumento de quase 300% em seu próprio salário e demonstrou ineficiência em resolver o problema da dívida do Estado com a União sem aderir ao RRF. 

“Belo Horizonte tem uma população com muitos servidores públicos e esses são os primeiros a sentir os feitos de uma má gestão. A insistência do governo em assinar o RRF, que de recuperação fiscal não tem nada. Falta de diálogo com o funcionalismo público. A recuperação salarial prometida na campanha para várias carreiras do funcionalismo não se efetivou. São muitos fatores negativos”, elenca Eulália Alvarenga.

Em declarações públicas, o governador também chegou a sugerir que os servidores públicos insatisfeitos com os salários buscassem a iniciativa privada e os chamou de “casta de privilegiados”. Porém, as categorias denunciam que existem trabalhadores vinculados ao Estado recebendo menos de um salário mínimo em Minas Gerais. 

“Tem também os diversos problemas de manutenção na Cidade Administrativa. E outros, que prejudicam a população, como a má gestão da saúde, piora nos serviços da Cemig e Copasa, principalmente devido à terceirização”, continua a economista, que também é membro da coordenação executiva nacional da Associação Brasileira de Economistas pela Democracia (Abed). 

Mineradoras são prioridade

Eulália ainda destaca as autorizações concedidas pelo governo a mineradoras para atuarem em locais de relevância cultural, ambiental e hídrica para Belo Horizonte, como a Serra do Curral, que é considerada o cartão-postal da cidade. 

“O movimento ambientalista é um dos principais setores organizados da sociedade contra as ações do governo, que tem compromisso explícito com a aceleração dos licenciamentos ambientais, com critérios duvidosos, em prol de atividades econômicas degradadoras do meio ambiente, mesmo após as grandes catástrofes de Mariana e Brumadinho. O que acontece na Serra do Curral e da Gandarela são exemplos de como opera o governo Zema”, analisa. 

De novo não tem nada

Romeu Zema foi eleito pela primeira vez em 2018, com o discurso de que representava a “nova política”, mesmo tendo apoiado e recorrido ao apoio de Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno das eleições. 

Passados seis anos de governo, na avaliação do cientista político Wallace Oliveira, a população já consegue perceber que o governador não representa nenhuma ruptura significativa com a política tradicional e, na realidade, é representante de um projeto político e econômico já conhecido pelos mineiros: o neoliberalismo. 

“Quem se elege com essa expectativa precisa dar respostas rápidas para a população. Mas ele não consegue, assim como Bolsonaro, cuja aprovação caiu muito rápido. Com o Zema, demorou um pouco mais, porque, durante a pandemia, Minas Gerais teve um aumento das receitas, além de não pagar a dívida. Isso cria a sensação de que é um governo melhor que o anterior”, avalia Wallace. 

“Somado a isso, ele fez política com parte do dinheiro do acordo com a Vale, que era para reparação dos danos do crime em Brumadinho. O que vimos na campanha de 2022 foi o Zema fazendo política com o recurso dos atingidos. Agora, a população já teve tempo suficiente para perceber que o governador não representa nenhuma mudança”, continua. 

Poderia ter feito mais que a gestão anterior

Wallace relembra que, em muitas ocasiões, Romeu Zema associou a dificuldade de cumprir algumas promessas à suposta herança de um Estado “quebrado” pela gestão anterior, de Fernando Pimentel (PT). Todavia, o cientista político explica que os governos Zema se dão em um cenário econômico muito mais favorável do que o do período entre 2014 e 2018. 

“Esse governo teve uma situação financeira melhor que a dos anteriores e, mesmo assim, não fez nenhuma intervenção estrutural que melhorasse a vida da população. Foram coisas muito pontuais, pequenas obras, pequenos projetos, com resultados que duram pouco. Já houve tempo suficiente para isso ficar evidente”, comenta.

“Pimentel, por exemplo, governou sendo assediado pelo STF por conta da questão da dívida do Estado com a União. O governo gastava muito para poder pagar a dívida e chegou a ter receitas sequestradas. No fim de 2018, Pimentel conseguiu uma liminar que suspende o pagamento da dívida, prorrogada até hoje. Quem veio depois [Zema], como consequência, já começa em melhores condições”, explica Wallace Oliveira. 

Mobilizações populares e sindicais

Os especialistas ainda destacam as mobilizações populares e sindicais como ponto fundamental para o aumento da rejeição ao governador na capital mineira. Apenas no primeiro semestre de 2024, eles avaliam que duas iniciativas de enfrentamento ao projeto de Romeu Zema chamaram atenção: a realização do Plebiscito Popular em Defesa das Estatais e a luta dos servidores públicos contra o RRF. 

“O plebiscito contra a privatização da Cemig, Copasa, Gasmig, Codemig e Codemge, por exemplo, atingiu mais de 300 mil pessoas e, quando você faz o debate com a população, a tendência é de que ele irradie. Zema também não esperava o tamanho da reação dos servidores públicos ao RRF, com atos, greves, paralisações, etc. Esses processos geram um grande desgaste do governo”, finaliza Wallace Oliveira. 

“Sindicatos e associações do funcionalismo público se mobilizaram muito, enfrentando a postura declarada do governo contra o funcionalismo e a insistência à adesão ao RRF. Os movimentos sociais também desenvolveram diversas ações de denúncia da política neoloberal do Zema”, conclui Eulália Alvarenga.
 

Da Redação