Avanço da monocultura de eucalipto no Recôncavo da Bahia preocupa comunidades tradicionais
Brasil de Fato
O Recôncavo da Bahia é a nova fronteira de avanço do monocultivo de eucalipto no estado, que já é o quarto maior produtor da árvore no país. A chegada de empresas do agronegócio à região preocupa comunidades tradicionais que realizaram um seminário em Cachoeira nesta segunda (23) e terça-feira (24) para construir um diagnóstico do avanço dessa plantação na região e cobrar medidas de proteção do Estado.
O engenheiro agrônomo e pesquisador Maicon Leopoldino, do Centro de Estudos e Ação Social (Ceas), explica que a Bahia viveu um primeiro ciclo de expansão do eucalipto nas décadas de 1980 e 1990 no Litoral Norte e no extremo Sul do estado. Nestas regiões, é possível observar um grande impacto negativo desse modelo de produção, com um longo histórico de violação de direitos coletivos e individuais e violências, como destaca o especialista.
“Tendo em vista o histórico não só na Bahia, mas no Brasil, de como essa atividade impacta na saúde, no território, na qualidade de vida dessas famílias camponesas, é necessário a esses grupos pensar como conter o avanço dessa atividade em seus territórios”, defende.
A professora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Juliana Neves, conta que o processo de expansão do eucalipto cresceu bastante nos últimos anos, alterando as paisagens locais e trazendo preocupação com insegurança territorial e alimentar. E destaca a importância de as comunidades se organizarem neste momento.
“A gente já conhece o quão devastador é o cenário que o eucalipto deixa, como ele impacta os territórios, os agricultores, os municípios. Atrás de um discurso de sustentabilidade, de melhoria de vida da população, o que acontece, na verdade, é uma situação de empobrecimento, de perda da biodiversidade, de êxodo de populações”, afirma a professora.
A região do Recôncavo é conhecida por ser território de um grande número de povos e comunidades tradicionais, dentre elas quilombolas, pesqueiras, marisqueiras e ribeirinhas. A presença dessas comunidades é responsável por boa parte da preservação de meio ambiente da região.
Uma das representantes dessas comunidades, a pescadora Carla Bastos, do quilombo São Braz, conta que o avanço do monocultivo de eucalipto tem se apresentado como uma ameaça ao direito dos povos de viver em seus territórios, retirar dali seus alimentos e promover seus modos de vida. “É necessário a gente ter essa desconstrução do que é desenvolvimento”, defende.
Poder público ausente
Conselho Pastoral de Pescadores e Pescadoras da Bahia-Sergipe (CPP BA-SE), UFRB, Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais da Bahia (MPP-BA), Campo – Cultura, Ambiente e Território, e a Articulação Nacional de Quilombos (ANQ) são os organizadores do evento. Eles convidaram órgãos públicos implicados no licenciamento ambiental, defesa de direitos coletivos, proteção ambiental, para participarem da discussão.
No entanto, apenas a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) enviaram representantes. Estiveram ausentes o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública do Estado (DPE) e Ouvidoria do DPE.
A Sepromi se colocou à disposição para ouvir as comunidades e entender como ajudá-las no enfrentamento dos problemas apresentados. Já o ICMBio informou sobre duas multas aplicadas contra uma empresa instalada no entorno da Reserva Extrativista Baía do Iguape, em Maragogipe.
Segundo a representante do ICMBio, Rafaela Farias, o processo administrativo das multas ainda está em curso, após recurso da empresa.