Conferência na Venezuela quer ajudar esquerda da América Latina para enfrentar o fascismo

Brasil de Fato

Organizar a esquerda em um enfrentamento à extrema direita. Esse foi o lema do Congresso Mundial contra o Fascismo, Neofascismo e expressões similares, realizado em Caracas nos dias 10 e 11 de setembro. Com diferentes movimentos de todo o mundo, a capital venezuelana foi palco de dois dias de debate para coordenar uma agenda global de combate ao avanço da extrema direita no mundo. 

A Venezuela é hoje um dos principais cenários de disputa e tensão com a extrema direita global. Para os debatedores, o território é usado como laboratório dos Estados Unidos na disseminação de ideias e no financiamento de organizações que impulsionam a face mais violenta do capitalismo. 

Atos violentos, ataques cibernéticos e planos de desestabilização encabeçados pelos EUA passaram a entrar na pauta do governo venezuelano nos últimos anos e esse discurso se intensificou depois das eleições de 2024, que marcaram a reeleição de Nicolás Maduro. Isso, somado à guerra econômica em curso desde 2016 contra a Venezuela, fizeram com que o Ministério das Relações Exteriores organizasse o evento para definir um rumo para os próximos anos. 

Diva Guzman Leon é deputada e vice-presidenta de mulheres do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) e foi uma das convidadas para discursar no congresso. Para ela, a situação no país é espelho para outros da região, que já tiveram experiências com a extrema direita, como Javier Milei na Argentina e Jair Bolsonaro no Brasil. . 

“Há situações vividas na Venezuela que nos preocupa que se transforme em um movimento em toda a América Latina e no mundo, que é a instalação de um modelo neofascista. E vemos o avanço em nível mundial. Como se orquestra os donos do capital em torno da construção de estratégias para desmontar governos e impor outros em experiências como Argentina e Brasil. Experiências que também têm sido realizadas na Europa. Que chegaram a extremos de criar e produzir guerras”, disse ao Brasil de Fato

Capitalismo e a extrema direita

O crescimento do fascismo e da extrema direita no mundo, para os debatedores, está intimamente ligada à crise do sistema capitalista. Para o congressista peruano Guillermo Rojas, o crescimento dessas forças é cíclico e responde a períodos de maior ameaça aos interesses do capital. 

“O fascismo é o cão de caça do capitalismo. O capitalismo gosta de eleições sempre que os capitalistas vão ganhar. E quando os interesses do capitalismo no mundo corem perigo, o que aparece é o fascismo, que é algo mais descarado. O neofascismo sempre volta a aparecer porque as crises do capitalismo são cíclicas. Quando eles veem que seus interesses começam a cambalear é onde eles mostram a cara e impõem seus direitos à sociedade. E também dentro do fascismo está incluída a questão do racismo”, afirmou ao Brasil de Fato.

O discurso é fundamental nesse processo, como se autodenominar como o “partido da ordem” e transmitir a ideia de que é preciso uma série de mudanças que vão desde um autoritarismo, em alguns casos, a uma política ultraliberal em outros. Para o ex-deputado peronista argentino Marcelo Koenig, a extrema direita hoje usa de uma série de ferramentas que são difusas, mas que têm o mesmo objetivo: impor políticas contrárias às da classe trabalhadora. 

“O nacionalismo para alguns grupos neofascistas é chauvinista, mas algumas vezes não. O autoritarismo é uma regra comum no neofascimo. Alguns deles reivindicam um livre mercado, o mercado sendo o ordenador superior das relações entre as pessoas. Há também uma reivindicação da antipolítica. Muitos deles têm uma visão destrutiva e negativa do próprio Estado”, afirmou.

Expansão do debate

Depois de dois dias de discussão, o evento terminou com anúncio do presidente Nicolás Maduro: a criação do Congresso Internacional Antifascista. O organismo vai reunir movimentos, lideranças e intelectuais que buscam combater o avanço do fascismo e da extrema direita no mundo e terá como sede a cidade de Caracas. 

Ter uma agenda internacional é também uma das principais ideias dos participantes. Guzman afirma que a Venezuela já é um dos principais articuladores históricos na luta anti-imperialista e anti-fascista. Ela afirma que, desde que o ex-presidente Hugo Chávez assumiu em 1999, o país se tornou protagonista na denúncia e no combate a grupos e articulações de extrema direita. 

“Chávez conseguiu unir uma grande quantidade de países latinoamericanos e de movimentos sociais. Além da liderança, nós temos crescido com uma liderança coletiva, diversa”, disse. A meta é que o debate chegue às universidades, movimentos sociais e organizações políticas de esquerda de diferentes partes do mundo. 

Para isso, uma das principais estratégias propostas pelos debatedores é criar núcleos e escolas de formação política. O foco seria ter uma aproximação com a juventude para desenvolver um pensamento latinoamericano que tenha abrangência. 
 
“As escolas de formação te dão um mínimo de entendimento comum de que coisas devemos brigar. Dizia o grande [Vladimir] Lenin de que não pode ser socialista aqueles que não são socialistas em todos os lados. Eu não posso só dizer que eu só quero o benefício do meu povo e da minha classe trabalhadora e se isso significa que tenho que invadir o outro, eu faço. Essa não pode ser a opção dos socialistas. Então o internacionalismo é inerente a todos que estamos no campo popular”, afirmou.

Da Redação