Brasil não dará prazo à Venezuela, mas aguarda atas para desfecho eleitoral, diz Amorim 

Brasil de Fato

O assessor especial da Presidência da República, o embaixador Celso Amorim, compareceu à Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal nesta quinta-feira (15) em sessão convocada pela oposição para esclarecer a atuação do governo brasileiro na mediação do impasse eleitoral na Venezuela.  

Senadores da extrema direita buscaram pressionar o embaixador a aconselhar o governo brasileiro a estabelecer um prazo para a apresentação das atas individualizadas das eleições na Venezuela. Amorim afirmou que “está muito clara a impaciência do presidente Lula” em relação à demora na divulgação das atas, mas que não seria prudente, em meio a uma negociação que envolve assuntos internos de outro país, estabelecer qualquer tipo de prazo para a apresentação das atas de votação.   

 “A impaciência não é boa conselheira”, disse Amorim.  “Colocar uma data fixa, um ultimato, eu acho que não é produtivo. A minha experiência, pelo que ela possa valer, indica que isso não traz bons resultados, mas seguiremos atentos”, explicou, afirmando ainda que a solução cabe ao povo venezuelano, e aos demais países compete apenas a mediação para evitar uma escalada do conflito interno. 

Reconhecimento do governo eleito 

Na sessão desta quinta no Senado, o ex-ministro afirmou que o governo brasileiro não reconhecerá nenhum governo sem a apresentação das atas eleitorais.  

“Se não houver nenhum acordo que possibilite avançar, nós não vamos reconhecer um governo se essas atas não aparecerem”, disse o ministro, que destacou ainda os princípios da diplomacia brasileira de defesa da democracia, não ingerência nos assuntos internos, e resolução pacífica de controvérsias.

“Por isso, temos insistido na publicação de atas. Não sei se isso agrada ou não ao presidente Maduro, mas nós nunca deixamos de insistir na publicação das atas”, afirmou. No entanto, Amorim ponderou que não seria “um bom precedente” reconhecer qualquer resultado a partir de documentos apresentados pela oposição.  

“O dilema que a gente tem hoje é que você tem de um lado o candidato, que é o presidente, que diz que ganhou, mas não mostra as atas. E de um outro lado, um grupo da oposição que tem as atas. Mas como é que nós poderíamos? Não seria um bom precedente reconhecer o presidente pelos documentos de que dispõem a oposição. Eu não estou dizendo que eles inventaram. Mas que é preciso ter uma solução que seja correta, que seja certa. Eu acho que o diálogo tem que ser incentivado, e acho que esse é o papel de países como o México, Colômbia e Brasil”, declarou. 

 

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O Brasil articula com Colômbia e México a mediação da situação da Venezuela. Juntos, os três países já pediram publicamente a publicação das atas eleitorais ao Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela (CNE).  

Direitos Humanos 

Os senadores da extrema direita questionaram o assessor especial da Presidência sobre a posição do governo brasileiro sobre a suposta violação de direitos humanos na Venezuela. Amorim afirmou que o Brasil tem uma tradição de defesa dos direitos humanos em todo e qualquer país, no entanto, apontou limites na capacidade de interferência da diplomacia brasileira para resolver questões relacionadas a soberania de outras nações. O embaixador mencionou o caso do ex-presidente Jorge Glass, do Equador, que está doente e foi preso após a invasão da polícia equatoriana à Embaixada do México em Quito.

“Eu não quero aqui entrar em discussão sobre outros países. Mas em um país latino-americano, tem um ex-vice-presidente preso, doente, e também nós não conseguimos tirar. O quê que eu posso fazer? A gente faz, o presidente Lula faz gestões, conversa, aí os países que têm mais interesse no Brasil, respeito pelo Brasil, atendem, os outros, às vezes não”, ponderou.  

Quem também mencionou o caso do ex-presidente equatoriano foi o senador Humberto Costa (PT-PE), que destacou o tratamento hipócrita dado pela extrema direita brasileira ao tema dos direitos humanos no mundo.

“Os que manifestam essas preocupações [pelos direitos humanos], ficaram caladinhos aqui quando o presidente do Equador mandou invadir a Embaixada do México e prender, na Embaixada do México, um ex-vice-presidente da República. Eu não vi a extrema direita brasileira dizer nada aqui, nem nessa comissão, nem no plenário, nem em lugar nenhum”, afirmou o senador. 

“Em 2018, o atual presidente da República foi impedido de disputar uma eleição que ele venceria por causa de um lawfare praticado no Brasil, seja lá em Curitiba, por um juiz de primeira instância, seja pelo próprio Supremo Tribunal Federal. Então carece de autoridade política para falar sobre esse tema, para criticar quem quer que seja”, lembrou Costa.  

Isolamento não é o caminho 

O ex-ministro Celso Amorim afirmou que o isolamento não ajuda a resolver os problemas, pelo contrário, afasta o Brasil de seu papel de mediação, e aproveitou para criticar a política externa do governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL).  

“Eu tenho que lembrar um princípio do direito internacional, que não há reconhecimento de governos, há reconhecimento de Estados. O Brasil não deixará, e não deveria ter deixado de ter jamais relações que o Venezuela como foi feita, retiraram até os embaixadores, a nossa embaixada estava lá jogada ao lixo, jamais”, criticou. “O que nós estamos tentando fazer é resolver essas questões pelo diálogo. Não como algumas pessoas pensaram em fazer no passado. Nós não vamos impor a democracia da Venezuela, nós vamos conversar”, afirmou.  

Também nesta quinta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a cobrar que o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela (CNE) publique as atas eleitorais, no entanto, ressaltou que é preciso “respeitar a soberania” do povo venezuelano. As declarações ocorreram durante entrevista à Rádio T, do Paraná.

Da Redação