Após enchente, MST retoma o plantio de arroz agroecológico no RS com semeadura coletiva
Brasil de Fato
Foi na lavoura da família Vedovatto que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) voltou a semear seu arroz agroecológico depois da tragédia que deixou casas e plantações submersas em maio deste ano. A abertura do plantio foi realizada nesta terça-feira (22) no Assentamento Integração Gaúcha, em Eldorado do Sul (RS), Região Metropolitana de Porto Alegre.
As sementes foram doadas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), numa parceria entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). O ato iniciou na lavoura que, meses atrás, ficou coberta por quatro metros de água. O plantio coletivo foi feito por mãos, trator e drone.
A ação da Conab no estado gaúcho vai distribuir mais de 245 toneladas de sementes agroecológicas e 473 toneladas de sementes adaptadas ao sistema orgânico. A iniciativa vai beneficiar 373 famílias atingidas com o cultivo de aproximadamente 4 mil hectares nos municípios de Nova Santa Rita, Eldorado do Sul, Viamão, São Jerônimo e Charqueadas.
Confira a reportagem em vídeo:
Otavino e Ignez Vedovatto celebram a retomada, sem deixar de trazer um olhar crítico.
“Representa um recomeço, apesar de todas as dificuldades que a gente tem, inclusive com os recursos do governo que não chegam. É só promessa. Veio um pouco de semente da Conab agora, que deu a oportunidade da gente começar a recomeçar. E a perspectiva é essa, né? Ir aos poucos, ir reconstruindo a atividade da família”, afirma Otavino.
“Nós temos que nos levantar, levantar a cabeça e voltar a fazer o que a gente fazia antes. E continuar, né? Sempre pensando para frente e com muito aprendizado também. Porque, com isso tudo, a gente aprendeu muita coisa. E vida que segue”, completa Ignez.
“Reafirmar a continuidade da reforma agrária”
Para Celso Alves da Silva, da coordenação do Grupo Gestor do Arroz Agroecológico, poder semear e plantar em um solo que, há poucos meses, estava alagado e com acesso impossibilitado é um momento especial.
“Para nós, hoje, é muita alegria poder fazer a abertura do plantio e reafirmar a continuidade da reforma agrária, do projeto de produção agroecológica, de produção de alimento saudável, de preservar o meio ambiente e, da mesma forma, poder, então, distribuir renda para nossas famílias”, celebra.
As ações contam com o apoio técnico da Cooperativa Central dos Assentamentos do Rio Grande do Sul (Coceargs), da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) e da Associação da Rede de Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (RedeCoop).
Celso reforça a importância da ajuda do Governo Federal. “Precisamos de muito apoio e muita ajuda nesse recomeço, nessa reconstrução. A gente está preparado para que… Não é de curto prazo, é de médio e longo prazo.”
Medidas de apoio às famílias
O ato prosseguiu na sede da Cooperativa dos Trabalhadores Assentados da Região de Porto Alegre (Cootap) e contou com a presença de autoridades locais e representantes do Governo Federal. Entre eles, o presidente da Conab, Edegar Pretto, o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), César Fernando Schiavon Aldrighi, e a ministra em exercício do MDA, Fernanda Machiaveli.
Na ocasião, foram assinados contratos que garantem medidas de apoio para as famílias atingidas, incluindo auxílio na produção agrícola, habitação e infraestrutura. “Esse arroz agroecológico que a gente tem tanto orgulho vai ter o apoio total para a retomada da produção pelo Governo Federal”, afirma a ministra.
“Hoje nós anunciamos, em primeiro lugar, que todas as estradas já têm o recurso e já estão começando as obras para serem reconstruídas dentro dos assentamentos da reforma agrária. As habitações que foram destruídas e que não podem de novo receber os seus moradores e moradoras vão ser reconstruídas, muitas delas em outros lugares, ou seja, as famílias vão ser reassentadas em locais apropriados para a produção e, ao mesmo tempo, apropriados para que elas vivam em segurança”, explica.
Fernanda também anunciou publicação do Decreto n.º 12.228 assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na tarde de terça-feira (22), que vai liberar mais uma operação do crédito instalação, modalidade fomento, para os assentados da reforma agrária gaúchos atingidos pelas enchentes. “Nós estamos fazendo o pagamento do crédito fomento, que são R$ 16 mil para cada uma das famílias de assentados e assentadas da reforma agrária aqui do Rio Grande do Sul, dos municípios que foram atingidos, para que eles retomem a sua produção.”
Cuidar da natureza e seguir lutando
Celso chama a atenção para os efeitos das mudanças climáticas. “A natureza deu o recado de que de fato tem muita destruição, veneno, desmatamento, poluição. Ela deu o recado e nesse recado aí ela não selecionou, pegou todo mundo.”
Ele destaca que o trabalho do MST ajuda na preservação do meio ambiente. “Mas temos certeza, sim, de que estamos no projeto certo, que cuida da natureza, que cuida do meio ambiente, que produz alimento, distribui renda. E seguimos firme nessa luta.”
Ao falar dos efeitos das mudanças climáticas, Salete Carollo, da direção nacional do MST, lembrou que “a reforma agrária popular se reinventa a cada período histórico, a cada conjuntura”. O que vai acontecer novamente, com a decisão coletiva de reassentar as famílias de Eldorado do Sul em novas áreas, por conta dos riscos da enchente no local.
Salete destacou a renovação do compromisso do MST em seguir lutando. “Se existe política pública na Conab hoje, no Governo Federal, é porque nós, assentados da reforma agrária, sonhamos com o projeto de agroecologia e implementamos.” Ela concluiu manifestando o desejo de ver as 1,5 mil famílias que hoje estão acampadas no Rio Grande do Sul assentadas até o Natal deste ano.