No Distrito Federal, Ato Global pelo Clima denuncia incêndios, grilagem e especulação imobiliária
Brasil de Fato
No dia 20 de setembro, o Ato Global pelo Clima, realizado pela organização Jovens pelo Clima, ocorreu em 50 países e em 15 cidades brasileiras, incluindo o Distrito Federal (DF). Em diferentes momentos, a mobilização destacou que nas últimas semanas a capital ficou encoberta pela fumaça ocasionada por incêndios florestais.
Para Ana Terra, integrante do Jovens pelo Clima no DF, apesar do governo progressista, as medidas adotadas para controlar os incêndios têm sido insuficientes. “Não são todos os ministérios que estão comprometidos com essa pauta do meio ambiente, da proteção da biodiversidade, dos nossos territórios, das terras públicas”, destaca.
Na avaliação de Geovani Santos, estudante de Licenciatura da Educação do Campo da Universidade de Brasília, a concentração de terras no país é um dos problemas. Ele também considera que o agronegócio está subjugando não apenas a posse e o uso da terra, mas “a identidade e a cultura das pessoas. Também está jogando no lixo as memórias dos indígenas, dos quilombolas”.
Desde o início do mês, o Corpo de Bombeiros do Distrito Federal registrou mais de 1.600 incêndios em vegetação, que queimaram cerca de 7 mil hectares. O registro já é maior que o número de ocorrências em todo o mês de setembro de 2023, quando foram notificados 1.383 incêndios.
O Cerrado é o bioma em processo mais avançado de destruição, somando 61% do volume desmatado em 2023. “O bioma tem um dos maiores índices de desmatamento do país, cerca de 52%, sendo que entre 2019 e 2020 perdeu 29 milhões de hectares de vegetação e, nesse mesmo período, 28 milhões de hectares foram destinados a atividades agropecuárias”, alerta um manifesto do Ato Global pelo Clima.
Especulação imobiliária
Para Matheus Adugo, indígena representante do povo Boe-Bororo, as características do incêndio que atingiu o Parque Nacional de Brasília ilustram a lógica do racismo ambiental. Ele destaca que essa região do DF é localizada em santuário indígena e disputada como setor de luxo pelo poder imobiliário.
“O Noroeste todo cheio de fumaça enquanto os playboy, os juízes e os grandes empresários estavam nos seus apartamentos com ar condicionado, a nossa aldeia e toda nossa reserva estava respirando fumaça”, disse ele, relatando que na comunidade “Santuário dos Pajés” moram crianças, idosos e pessoas com doenças crônicas que foram submetidos à fumaça.
O ambientalista Pedro Ivo, presidente da organização socioambiental Alternativa Terrazul, alerta sobre o papel da grilagem e da especulação imobiliária como agravantes dos problemas ecológicos do DF. Ele cita como pontos de avanço desses setores o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) e o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília (PPCUB).
“Esses projetos querem transformar áreas rurais em áreas urbanas, mas não é para fazer casa para os pobres; serve apenas para a especulação imobiliária invadir com grandes condomínios e encher o bolso das construtoras”, avalia.
Crise hídrica
Para Flavão Cerratense, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), entre os problemas ambientais mais graves de Brasília está o provável esgotamento das fontes hídricas da região.
“Vai faltar água no Distrito Federal se continuarmos nessa lógica da especulação imobiliária, que comanda milhares de terras e influencia nosso legislativo e executivo. Essa lógica do capitalismo aqui em Brasília, com a especulação imobiliária e a exploração das terras, está fazendo do Brasil um país sem água”.
Ele indica como solução urgente para o resgate de áreas prejudicadas por incêndios, a “agricultura de regeneração”. “Precisamos focar na reforma agrária, criando zonas de amortecimento nas áreas de proteção ambiental e nas áreas de proteção de mananciais, para garantir água aqui no Distrito Federal”.
A gestora ambiental Letícia Camargo aponta que, segundo o Plano de Adaptação Climática do DF, “considerando os reservatórios do Descoberto, de Santa Maria e Paranoá, a utilização máxima da capacidade dos reservatórios seria suficiente para cobrir apenas 72% do consumo total projetado para 2030. O que é gravíssimo”.