Após acordo no STF, indígenas esperam indenização para retirada de fazendeira, que segue em TI sob escolta da PM
Brasil de Fato
O clima está “mais tranquilo”, disseram lideranças da Terra Indígena (TI) Nhanderu Marangatu ao Brasil de Fato, depois que, em audiência no Supremo Tribunal Federal (STF), foi firmado o acordo para que fazendeiros se retirem do território em Antônio João (MS) mediante indenização do Estado.
Sem data definida publicamente para o pagamento ocorrer, no entanto, os proprietários da Fazenda Barra – Pio Queiroz e Roseli Ruiz – seguem no território sob escolta da Polícia Militar (PM). A Força Nacional também está presente na área.
A audiência de conciliação mediada pelo gabinete do ministro Gilmar Mendes na última quarta-feira (25) aconteceu depois que o conflito, que se arrasta há décadas, escalou. Após uma tentativa dos indígenas de retomar a área da Fazenda Barra em 13 de setembro, a PM alvejou uma mulher no joelho e um jovem na cabeça. Neri Ramos, de 23 anos, morreu na hora. Dias depois, Fred Garcete, Kaiowá de 15 anos, foi encontrado morto na estrada.
Depois de sete horas de negociação em Brasília, foi assinado o acordo de que a União deve pagar uma indenização de R$ 27,8 milhões aos fazendeiros pelas benfeitorias feitas nos imóveis sobrepostos ao território indígena. Outros R$ 102 milhões serão pagos (majoritariamente pela União, mas também pelo governo do Mato Grosso do Sul) pelo Valor de Terra Nua (VTN), ou seja, o preço de mercado do imóvel sem contar construções ou instalações.
Enquanto o debate público se acirra em relação à abertura de precedente sobre a indenização de fazendeiros por terra nua, algo que ruralistas defendem e que organizações como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) dizem ser inconstitucional, os Guarani Kaiowá de Nhanderu Marangatu contam os dias para ocupar de uma vez por todas os 9.317 hectares de seu território.
O próximo passo para que isso aconteça é o pagamento das benfeitorias, que deve ser realizado pela Fundação Nacional dos Indígenas (Funai) por meio de crédito suplementar. Feito o depósito, os fazendeiros terão 15 dias corridos para sair da área.
O Brasil de Fato questionou a Funai e o STF sobre a previsão para que o pagamento ocorra e não teve resposta até o fechamento desta matéria. O espaço segue aberto. A data não está estipulada na ata do acordo.
Advogados indigenistas que acompanham o caso afirmam ter a expectativa de que as benfeitorias sejam pagas em até 30 dias e que, assim, até o fim novembro não haja mais fazendeiros no território.
Já Nalva*, liderança de Nhanderu Marangatu, acredita que o pagamento deve levar até três meses. “Estamos aguardando essa indenização, né? Mas, assim, a fazendeira continua, ela anda escoltada com segurança do Estado dentro da aldeia”, conta.
“Estamos vivendo esta situação: não muito bem, mas também não muito mal”, define João*, outro Guarani Kaiowá. “Ainda temos dificuldade de acessar água e alimentos, estamos pedindo doação”, relata.
O que diz o acordo
Após o depósito dos cerca de R$ 28 milhões em indenização por benfeitorias e a retirada dos fazendeiros em até 15 dias, “a comunidade indígena ingressará no imóvel de forma mansa e pacífica”, diz a ata da audiência de conciliação.
O Estado deverá pagar o valor restante de R$102 milhões divididos aos fazendeiros proporcionalmente aos hectares de seus imóveis, por meio de precatórios. Este pagamento deve ocorrer entre 2025 e 2026.
“As partes se comprometem a suspender imediatamente os atos de hostilidade”, discorre o documento firmado, “e a Polícia Militar do Estado do Mato Grosso do Sul manterá o policiamento ostensivo apenas na área da Fazenda Barra e na estrada até a rodovia, utilizando o uso proporcional da força quando estritamente necessário”.
* Nomes alterados para a preservação da fonte.