Quilombolas de Jacuizinho (RS) vão integrar o Programa Nacional de Reforma Agrária

Brasil de Fato

As famílias quilombolas do município de Jacuizinho (RS) receberam o reconhecimento para integrar o Programa Nacional de Reforma Agrária. A portaria 653 já foi publicada no Diário Oficial da União e permitirá aos moradores do território quilombola Novo Horizonte/Rincão dos Caixões acessar o Crédito Instalação e ações de infraestrutura, além de outras políticas públicas destinadas a agricultores assentados.

Jacuizinho é um município do Planalto Central do Rio Grande do Sul, fica a 303 quilômetros de Porto Alegre, e tem 22 famílias integrantes da Associação Comunitária Remanescente de Quilombo Novo Horizonte/Rincão dos Caixões.

A decisão facilitará a vida por lá, já que até agora eles não tinham acesso a crédito para desenvolver a sua agricultura, sua principal atividade econômica, com uma variada produção para autoconsumo, relata o presidente da entidade Nelton dos Santos.

Para o andamento do processo de inserção no programa, a próxima etapa será conferir os critérios de cada família para serem homologadas no Sistema de Informações de Projetos de Reforma Agrária (Sipra) do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Entre as condições exigidas estão a ocupação de cargo, emprego ou função pública remunerada, ser proprietário, cotista ou acionista de empresa em atividade, ter renda de atividade não agrícola superior a três salários-mínimos mensais ou a um salário-mínimo por membro da família.

Em relação à regularização fundiária do território da comunidade, o Incra aguarda a conclusão das ações de desapropriação para emissão do Título de Domínio em nome da associação quilombola.

O processo começou em 2006, com Portaria de Reconhecimento publicada em 2010 e decreto autorizando as desapropriações em 2012. Em 2016, o Incra foi imitido na posse da integralidade do território (226 hectares), que está totalmente sob usufruto do grupo remanescente de quilombo.

“Melhorou muito nossa vida, sem comparação. Não tínhamos nem uma quadrinha para plantar, agora temos nossa terra. Com o crédito, vai ficar melhor ainda”, afirma Nelton.

A população do Novo Horizonte/Rincão dos Caixões possui laços de parentesco com as comunidades quilombolas Júlio Borges, em Salto do Jacuí, e Linha Fão, em Arroio do Tigre. Este último era o local de origem de Erocilda Santos, matriarca da comunidade que migrou para Jacuizinho quando sua família foi pressionada a deixar as terras anteriormente ocupadas.

O nome Rincão dos Caixões deve-se ao rio, nomeado de Caixões, que tem seu curso próximo ao território.

Município

A criação do município de Jacuizinho aconteceu em 16 de abril de 1996, pela Lei Estadual 10.757. A instalação foi em 1º de janeiro de 2001. A origem do nome Jacuizinho homenageia o rio que atravessa a cidade, por ser uma das belezas naturais da região e também o principal afluente do Rio Jacuí, um dos maiores do estado.

Outra versão aponta o nome como origem indígena, que significa o hibridismo de “Jacú” (ave galinácea) e “Y”, rio com o sufixo luso acrescido ao nome guarani.

A colonização daquela região começou em 1877, quando fixaram residências as famílias descendentes de açorianos, alemães, espanhóis, italianos e negros, provenientes de localidades vizinhas, como Santa Cruz do Sul, Cruz Alta, Soledade, Cachoeira do Sul e outras.

Os alemães foram os pioneiros na colonização do povoado. Os colonizadores foram buscar um espaço, criando gado e plantando arroz para subsistência das famílias. Muitos chegaram com “ofícios” definidos e abriram pequenas fábricas, oficina, ferrarias e olarias. As casas construídas com arquitetura germânicas caracterizavam bem o estilo europeu. 

Em 1890 surgiram as primeiras casas comerciais, como a fábrica de gasosa de Fritz Textor, a água usada era de uma fonte de água natural existente atrás de sua casa. A primeira “Casa Comercial” da localidade, conforme relato, era de Catulina Kertch e vendia de tudo, desde alimentos até tecidos. Por volta de 1894, a “Casa Comercial” de Jacó Kuhn tinha também uma ferraria.

Jacuizinho era, em 1958, distrito de Passo Fundo, depois, de Soledade, Espumoso e Salto do Jacuí. Esse cenário histórico descortina na Igreja Menino Deus, construída em 1883. Em seu altar, está a imagem do menino Jesus esculpida em madeira, trazida para à localidade em 1880.

Entre outros fatos pitorescos está a história dos Monges Barbudos, que, na metade do século passado, fixaram residência na vila. 

O município também preserva uma reserva ecológica nativa, rica em fauna e flora. Nos seus balneários, a natureza apresenta um verdadeiro show de beleza e encantos naturais, além do pôr-do-sol do Lago do Passo Real. No parque de rodeios está uma centenária árvore pitangueira, com seus galhos formando uma verdadeira obra de arte.

Quilombola

A existência de quilombos contemporâneos é uma realidade latino-americana. Tais comunidades são encontradas na Colômbia, Equador, Suriname, Honduras, Belize e Nicarágua. E em diversos desses países – como ocorre no Brasil –, o direito às terras tradicionais é reconhecido na legislação nacional. O Incra, por força de lei, é o órgão responsável pela titulação dos territórios quilombolas no Brasil.

O processo para o reconhecimento e regularização das áreas quilombolas possui várias etapas: 1) Autodefinição Quilombola – obtenção da Certidão de Autorreconhecimento emitida pela Fundação Cultural Palmares; 2) Elaboração do RTDI – Relatório Técnico de Identificação e Delimitação – levantamento de informações cartográficas, fundiárias, agronômicas, ecológicas, geográficas, socioeconômicas, históricas, etnográficas e antropológicas. Este tem por objetivo identificar os limites das terras das comunidades remanescentes de quilombos; 3) Publicação do RTDI; 4) Portaria de reconhecimento – publicação de portaria no Diário Oficial da União e dos estados que reconhece os limites do território quilombola. 5) Decreto de desapropriação – no caso em que há imóveis privados (títulos ou posses) incidentes no território. 6) Titulação – titulação mediante a outorga de título coletivo, imprescritível e pró-indiviso à comunidade, em nome de sua associação legalmente constituída.

No Brasil, conforme o Censo 2022, são 8.440 localidades quilombolas, sendo que o Rio Grande do Sul possui 203. Bahia e Maranhão são responsáveis por aproximadamente 45% dessas localidades.

Em relação à população quilombola, no Brasil são 1.330.186 pessoas, segundo o Censo 2022. No Rio Grande do Sul, são 17.552 pessoas quilombolas. Os municípios do estado com maiores populações quilombolas são Porto Alegre, Formigueiro e Canguçu.   

Quilombo por definição clássica era o local com concentração de pessoas negras que se rebelaram contra o regime colonial no Brasil e que perdurou por mais de 300 anos. Mesmo após a abolição da escravatura, essas áreas continuaram existindo.

A Constituição Federal de 1988 alterou o termo, que passou então a ser definido como a área ocupada por comunidades remanescentes desses antigos quilombos. Além disso, também assegurou a essas comunidades o direito à propriedade de suas terras.


Da Redação