Brasil mantém acordos de cooperação com Israel um ano após início do conflito em Gaza, alertam ativistas
Brasil de Fato
“Se Lula reconhece o genocídio palestino e não toma ações concretas, torna-se cúmplice”, afirma a professora de sociologia da Universidade de Brasília (UnB) Berenice Bento, em referência ao conflito em Gaza, que completou um ano nesta segunda-feira (7), dia em que Israel voltou a intensificar bombardeios contra o território palestino. Ao menos oito pessoas foram mortas em um ataque ao campo de refugiados de Jabalia, em Gaza, de um total de 39 assassinados no dia.
Para a professora da UnB, a condenação verbal feita pelo presidente brasileiro em instâncias como a Organização das Nações Unidas (ONU) não é suficiente para contribuir com o fim da violência no território palestino, considerada como genocídio pela África do Sul e outros 50 países em um caso que tramita na Corte Internacional de Justiça (CIJ) da ONU, em Haia.
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Presente no ato político realizado por movimentos de solidariedade à Palestina neste domingo (6) em Brasília (DF), Berenice Bento destacou ainda que o Brasil é uma “potência mundial” com poder para influenciar o “equilíbrio diplomático” entre os países.
“O Brasil, ao não agir, está contribuindo para o genocídio. Continuar comprando armas de Israel, que são testadas nos corpos das crianças palestinas, é incompreensível”, diz a professora. Em abril deste ano, o Brasil de Fato mostrou que o exército brasileiro fechou acordo de R$ 1 bilhão com a empresa Elbit Systems, uma das maiores fabricantes de armas e sistemas militares de Israel.
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Já nesta segunda-feira (7), o Comitê em Solidariedade à Palestina do DF protocolou um documento junto à ONU cobrando que a entidade “assuma seu papel institucional e legal, em defesa do povo palestino”.
“Israel tem deliberadamente estendido a sua guerra de agressão para outros países da região, com a clara intenção de repetir no Líbano e na Síria o que vem fazendo criminosamente na Faixa de Gaza”, diz o texto. Leia na íntegra.
Para a médica e ex-deputada federal Maria José Conceição (Psol), conhecida como Maninha, o prolongamento do bombardeio em Gaza indica que a guerra “está banalizada ao redor do mundo”.
O mês de outubro começou com ataques de Israel contra o Líbano, a Síria e Gaza, e bombardeios dos Estados Unidos contra o Iêmen. Também está em curso a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, cujo estopim foi 24 de fevereiro de 2022.
“A conjuntura mundial nos força a uma reflexão: precisamos nos unir. As guerras e as políticas não são mais localizadas, elas são globais. Por isso, devemos combater esse eixo do mal que invade, massacra e pratica o genocídio”, defendeu Maninha.
Contexto recente
Em 7 de outubro de 2023, integrantes do grupo político fundamentalista Hamas invadiram cidades israelenses próximas à fronteira com a Faixa de Gaza, deixando 1.139 pessoas mortas e cerca de 250 reféns, de acordo com registros do regime sionista.
A subsequente campanha militar do exército de Israel em Gaza matou mais de 42 mil palestinos, dentre as quais cerca de 17 mil crianças, segundo o Ministério da Saúde do enclave costeiro. A ofensiva sionista deslocou quase toda a população de 2,3 milhões de pessoas e causou uma crise humanitária, de fome e de saúde no território. No mesmo período, em Israel, cerca de 1.200 pessoas foram mortas, considerando as vítimas do ataque de 7 de outubro.
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Em entrevista ao Brasil de Fato DF em 21 de outubro de 2023, Farouk Mansour, membro da comunidade palestina no DF, refugiado no Brasil há 16 anos, afirmou que acompanhava aflito os bombardeios em Gaza pela televisão e que não tinha conseguido contato com a família desde o início do conflito.
Quase um ano mais tarde, em nova declaração à reportagem, ele afirmou neste domingo que segue sem notícias dos familiares. Soube por último que estavam abrigados no Hospital Nasser, em Khan Younis, ao sul da Faixa de Gaza, bombardeado e sitiado por Israel na noite entre 14 e 15 de fevereiro.
Manutenção de acordos com Israel
Neste contexto do conflito, a Câmara dos Deputados aprovou três novos acordos de cooperação entre Brasil e o estado judeu, onze dias após a nova escalada de agressões na região, em 18 de outubro de 2023. Os textos agora aguardam análise do Senado.
“O governo brasileiro, eleito pelo povo, precisa romper todos os acordos com Israel. Deve romper todas as relações com Israel, porque as armas que assassinam o povo palestino são as mesmas que matam nossos jovens nas periferias do Brasil”, disse a deputada federal Erika Kokay (PT), em discurso no ato de domingo.
Em 24 de setembro, na abertura da 79ª edição da Assembleia Geral da ONU, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) condenou a “punição coletiva” de Israel contra o povo palestino.
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“O que começou como ação terrorista de fanáticos contra civis israelenses inocentes, tornou-se punição coletiva de todo o povo palestino. São mais de 40 mil vítimas, em sua maioria mulheres e crianças. O direito de defesa transformou-se no direito de vingança, que impede um acordo para a liberação de reféns e adia o cessar-fogo”, afirmou na ocasião.
O mandatário brasileiro também criticou o número de conflitos e os gastos militares em todo o mundo, afirmando que o recurso poderia ter sido usado para o combate à fome e para as mudanças climáticas.
Questionado sobre o rompimento de relações diplomáticas com o estado judeu, o Itamaraty não respondeu. Disse apenas que “manifestou reiteradas vezes ao longo deste ano, em nome do governo brasileiro, posicionamento de condenação aos ataques terroristas do Hamas à resposta desproporcional de Israel e à consequente tragédia humanitária em Gaza”.
A nota do Ministério das Relações Exteriores também diz que já manifestou “posição em favor de um cessar-fogo imediato, da liberação incondicional dos reféns e da facilitação de entrada de ajuda humanitária em Gaza”.
Conflito histórico
Sayid Marcos Tenório, do Instituto Brasil Palestina (Ibraspal), defende que o conflito em curso na Faixa de Gaza “fez o mundo despertar para um processo que vinha sendo omitido há 76 anos”.
A situação no território é de constante tensão desde o Plano de Partilha da Palestina aprovado pela Assembleia Geral da ONU em 1947, criando o Estado de Israel. Na ocasião, nem os palestinos nem países da Liga Árabe aceitaram a proposta de divisão do território. Consideravam que ela contrariava a própria Carta das Nações Unidas, de 1945, segundo a qual cada povo tem o direito de decidir seu próprio destino.
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Esse foi o estopim para a guerra árabe-israelense de 1948, chamada por palestinos de Al-Nakba, ou “a catástrofe”. O conflito resultou na expulsão de cerca de 800 mil palestinos de seus territórios, dando início à “diáspora palestina” – cerca de 75% da população de Gaza, por exemplo, é refugiada ou descendente de refugiados do Nakba.
“O poderio da mídia hegemônica tinha lançado uma cortina de fumaça sobre a luta do povo palestino, fazendo com que o senso comum entendesse que a vítima era a agressora”, argumentou o ativista do Ibraspal, afirmando que agora o mundo “conhece a verdadeira natureza de Israel”.
Para Marcos Tenório, as declarações de Lula condenando o conflito foram “positivas”, mas ele defende que faltam “demonstrações concretas” de apoio ao povo palestino, sugerindo o rompimento de contratos e de relações com o regime sionista.
“Certamente outros países seguiriam o seu exemplo. Lula precisa ter coragem e ousar. O sionismo é um câncer que está corroendo a humanidade.”
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