Máfia das creches, PCC e criminalização do MTST: último debate em SP tem troca de acusações e Nunes na defensiva contra Boulos

Brasil de Fato

Nas vésperas do segundo turno, Guilherme Boulos (Psol) e Ricardo Nunes (MDB) mantiveram o tom agressivo nas trocas de acusações no último debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, nesta sexta-feira (25), promovido pela TV Globo. As propostas de ambos, porém, ficaram ofuscadas.

Em clima de acirramento, os dois chegaram a se aproximar fisicamente, utilizaram-se de falas sarcásticas e investiram nas críticas. No entanto, o candidato da esquerda foi mais incisivo em seus ataques, enquanto Nunes ficou na defensiva e falou demasiadamente em números. O prefeito tem 50% das intenções de voto, e Boulos, 41%, de acordo com pesquisa da Real Time Big Data divulgada hoje.

Logo no primeiro bloco, Boulos associou Nunes ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a políticos que já comandaram a cidade de São Paulo, como João Doria. O candidato do Psol também tentou colar no atual prefeito uma imagem de “péssimo” gestor para a capital paulista.

Boulos culpou Nunes pelos apagões na capital paulistana, que deixaram milhares sem energia no ano passado e nas últimas semanas. Também falou sobre a concessão da gestão dos cemitérios à iniciativa privada, em março do ano passado. Desde então, os sepultamentos no município de São Paulo ficaram cerca de 11 vezes mais caros. “Você que precisou de serviço funerário, que perdeu um ente querido em São Paulo, você acha que está melhor?”, perguntou Boulos, que continuou, dirigindo-se a Nunes: “Depois da sua privatização, você não se arrependeu?”

Pauta moral

Já o atual prefeito buscou colar a imagem do psolista a propostas consideradas radicais por setores conservadores, como a legalização das drogas. Ele também insistiu no tema da segurança pública, ao falar sobre a ausência de Boulos na votação do Projeto de Lei 3780/23. O texto, de autoria do deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP), aumenta as penas dos crimes de furto, roubo e receptação.

“Você sempre defendeu a liberação de drogas, já tem vários vídeos. Você não entende que a liberação de drogas acaba prejudicando os nossos jovens, as famílias, as mães sofrem com isso. Por que você sempre defendeu a liberação de drogas? Por que você não votou a favor do aumento da pena das pessoas criminosas?”, questionou Nunes. “Como é que a gente vai poder melhorar a segurança se você não volta o aumento de pena Você quer liberar drogas?”, disse.

O deputado federal afirmou que não estava no plenário da Câmara no dia da votação devido a um compromisso no Palácio do Planalto com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Sobre a questão das drogas, Boulos afirmou que sempre defendeu a diferenciação entre traficantes e usuários. “O que eu sempre defendi foi a diferenciação de usuário e traficante. Traficante de droga que estraga a vida dos outros é criminoso. Usuário, dependente químico, não tem que ser preso, ele tem que ser tratado, tem que ser recuperado. É isso que eu defendo e que eu sempre defendi”, afirmou.

Máfia das creches e PCC

Nos blocos seguintes, as investidas entre ambos continuaram. Ricardo Nunes provocou Boulos ao lembrar que a candidata à vice do adversário, Marta Suplicy, que hoje é do Partido dos Trabalhadores, foi a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, da mesma sigla. “Você podia responder como é que você acha que ela liderou o processo do impeachment da Dilma”, disse Nunes depois que Boulos pediu voto para a sua chapa.

Em outros momentos, o candidato do Psol citou investigações e denúncias que rondam a gestão atual e o próprio nome do prefeito, como o que ficou conhecido como a “máfia das creches”, que envolve o desvio de recursos públicos do atendimento de crianças de zero a três anos na cidade de São Paulo para entes privados.

De acordo com a Polícia Federal (PF), que investiga o caso, trata-se de um “complexo esquema de desvio de valores públicos, inclusive verbas federais, que estaria sendo realizado por Organizações Sociais e Mantenedoras de Centros de Educação Infantil e creches”. Nunes não chegou a ser um dos 117 indiciados pela PF, mas foi alvo de um pedido de abertura de inquérito específico.

“Você acabou admitindo que recebeu dois cheques de uma das pessoas investigadas na máfia das creches. Por que foi recebido na sua conta pessoal do Santander e não na conta da sua empresa [que teria prestado os serviços]? Essa pergunta foi feita a você pela Polícia federal num depoimento e você não respondeu. Eu estou te dando mais uma oportunidade de responder para que o povo de São Paulo saiba”, disse Boulos. Na defensiva, Nunes apenas classificou como “triste” a declaração do adversário: “É muito triste que a gente queira que discutir a cidade. Você vem criar essas mentiras”, concluiu, no fim do terceiro bloco.

No bloco seguinte, Boulos citou Eduardo Olivatto, chefe de gabinete na Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb), que é ex-cunhado de Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, líder da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). “É o crime organizado entrando na prefeitura”, disse Boulos. “Ele não quer discutir a cidade. Ele só quer atacar. Ele só fica falando mentiras. (…) Eu estou aqui estarrecido”, respondeu Nunes.

Ainda no terceiro bloco, Boulos respondeu a uma acusação de Nunes com outra acusação, o que deixou claro o tom do debate. O prefeito falou sobre um relatório da Polícia Civil de São Paulo sobre a detenção de dois integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), o próprio Guilherme Boulos e José Ferreira Lima. Ambos foram acusados de ataques contra a Polícia Militar paulista. O caso aconteceu durante a desocupação do Pinheirinho, que ocorreu com ação violenta da Polícia Militar.

“Uma pessoa que tem essa histórico de vida… Aliás, você se arrependeu de ter depredado a Fiesp [durante outra manifestação do MTST]?”, questionou o prefeito. Em resposta, Boulos voltou a falar sobre a máfia das creches: “Está sendo investigado sim pela Polícia Federal na máfia das creches”.

O debate da Globo foi o terceiro antes do segundo turno. Antes, foram realizados o encontro da Band, em 14 de outubro, quando o tema do apagão em São Paulo dominou o encontro, e o da Record, no dia 19.

Nunes faltou ao debate realizado pela Folha de S. Paulo, UOL e Rede TV, no dia 17, e a atividade acabou se tornando uma sabatina do candidato do Psol, que criticou a ausência do adversário. No dia seguinte, o cenário se repetiu: o debate que seria realizado SBT, Terra e rádio Nova Brasil foi cancelado após a desistência de Ricardo Nunes. Antes do apagão, no dia 10 de outubro, Nunes também desistiu do espaço realizado pelos jornais Globo, Valor Econômico e rádio CBN no dia 10 de outubro. 

Da Redação